M.L: Quando surgiu o interesse pela escrita?
A.C: O meu interesse pela escrita
nasceu do meu interesse por livros. Desde pequena que gosto de me perder num
bom enredo, de me deixar levar pelas palavras dos outros. As palavras dos que
fazem da escrita profissão, sempre foram uma espécie de alento na minha vida. A
escrita surgiu como uma consequência natural do gosto pela leitura, sentia-me
compelida a escrever. Tudo era um bom motivo para o fazer.
M.L: Quais são as suas influências, enquanto
escritora?
A.C: Apesar de ter escritores que venero e aos quais presto vassalagem das mais
diversas formas, não posso dizer que fui influenciada por algum escritor em
particular, pois a minha maior influência é a vida. A minha vida, a vida
daqueles que me rodeiam. Os afetos, meus e dos outros. Estou sempre alerta e
atenta. A permeabilidade ao mundo, é uma das coisas que nunca quero perder,
pois é ela o meu grande motor no que respeita à escrita.
M.L: Qual foi o trabalho que a marcou, durante o seu
percurso como escritora?
A.C: O meu percurso é pequeno ainda. Espero ter muitas
páginas pela frente, enquanto escritora, pois só agora começo a ver-me como
merecedora dessa designação. Mas, tentando responder à tua pergunta, o que mais
me marcou foi este último livro, “Todas as Palavras de Amor”. Foi através dele
que aprendi a não desistir daquilo que mais gostava de fazer: Escrever. Foi
através dele que senti que tudo, até aqui, tinha valido a pena.
M.L: Como escritora escreveu para literatura e para
televisão. Qual destas áreas que lhe dá mais gosto de escrever?
A.C: Foi o meu primeiro romance que
me levou aos guiões. O Manuel Arouca leu o manuscrito do “A Vontade de Regresso”
e chamou-me para trabalhar na sua equipa, apresentando-me a um mundo totalmente
diferente, em termos de escrita. O tom coloquial e mais instantâneo é
fundamental em guionismo e eu tive que me libertar de várias camadas, até
atingir aquele ponto que se deseja nos diálogos mais fluídos. O guionismo
sempre me desafiou em termos de criatividade, pois aqui as tuas ideias e a tua
imaginação são constantemente postas à prova e é necessária uma agilidade
mental, muitas vezes, desgastante. Estás sempre a jogar com uma certa dose de
desconhecido, pois o que funciona para ti, pode não funcionar para quem vai ver
e pode não funcionar para quem vai representar ou para os meios ao dispor da
produção. São duas coisas totalmente distintas, mas que podem coexistir pacificamente,
complementando-se, até. Confesso que o que mais me completa é a literatura e o
que mais me desafia é o guionismo.
M.L: Gostava de experimentar outras áreas como, por
exemplo, o cinema?
A.C: Se estamos no campo do sonho, aqui vai: Adorava
experimentar cinema. Também adorava poder escrever disparates ou outra matéria
igualmente relevante, para uma publicação jornalística e ser paga para isso.
M.L: Entre 2008 e 2009 escreveu juntamente com Manuel
Arouca, Tomás Múrias e Melissa Lyra, a telenovela “Podia Acabar o Mundo” que
foi exibida na SIC. Que recordações guarda desse trabalho?
A.C: Felizmente, guardo recordações boas de praticamente
todos os meus trabalhos. “Podia Acabar o Mundo” foi a primeira novela que
escrevemos para a SIC e, por esse motivo, um desafio maior.
M.L: Qual foi o momento que mais a marcou, durante o
seu percurso como escritora?
A.C: Foi a primeira reunião que
tive com o Manuel S. Fonseca, na editora Guerra e Paz. Ele ligou-me, depois de
ler o meu manuscrito e quis encontrar-se comigo no dia seguinte. Quando ele me
disse: “Nós estamos muito interessados em editar esta história”, eu senti que
era o princípio de muitas coisas importantes na minha vida.
M.L: Como vê atualmente a Cultura em Portugal?
A.C: Acho que somos absolutamente
extraordinários a desenrascarmos projetos com poucos meios. A arte de fazer
bem, ou menos mal, com poucos recursos, é uma arte muito portuguesa e terá que
se reinventar de novo, dada a negra conjuntura do país. Também sinto que os
portugueses estão cada vez mais sedentos de cultura acessível e de qualidade. A
cultura deveria ser acessível a todos. Deveria ser banalizada e vista como uma
manifestação intrínseca de uma sociedade saudável. Em certas capitais europeias,
não tão faustosas quanto isso, estás sempre a esbarrar na cultura, como parte
da cidade e dos seus habitantes.
M.L: Gostava de fazer uma carreira internacional?
A.C: Se, por carreira
internacional, te referes a ver o meu livro traduzido em dezenas de línguas,
sim. Se te referes a um convite para adaptar o meu livro ao cinema francês, italiano,
britânico, sonhemos em grande, americano, é claro que sim também, que eu não
sou de fugir a sonhos bons…
M.L: Como é que é a sua rotina, quando escreve?
A.C: Como tenho filhos pequenos, tenho
que adaptar as minhas rotinas às rotinas deles. Já não tenho aquela liberdade
total de escrever a qualquer hora do dia e da noite. Gosto sempre mais de
começar a escrever de manhã muito cedo, com uma boa caneca de café e,
geralmente, bandas sonoras de filmes a tocarem no Mp3.
M.L: Recentemente, a telenovela da SIC “Rosa Fogo”, da
qual participou no arranque do projeto, foi nomeada para o Emmy Internacional
na categoria de Telenovela. Como vê este reconhecimento internacional?
A.C: Como disseste bem, participei no arranque da
novela, por isso não me envolvi do princípio ao fim do projeto. Mas fico sempre
feliz, quando um projeto português passa a ser falado além-fronteiras.
M.L: Qual foi a pessoa que a marcou, durante o seu
percurso como escritora?
A.C: Eu não consigo dissociar o meu
“percurso” como escritora, do meu percurso como pessoa. Por isso, haverá sempre
quem/o que me inspire e me marque o suficiente para ter vontade de escrever
sobre isso. Tenho que tentar manter sempre os olhos e o coração abertos.
M.L: Como vê o futuro da Cultura em geral nos próximos
anos?
A.C: Um país que corta na educação e na saúde, é um
país que não dará qualquer espécie de prioridade à cultura. Infelizmente é
isto. O que não quer dizer que nos transformemos numa sociedade embrutecida, pois
muitas vezes, é das situações mais adversas que nascem os grandes rasgos e que
as pessoas mais se viram para o que lhes dá alento espiritual.
M.L: Qual o conselho que daria a alguém que queira
ingressar numa carreira na escrita?
A.C: Rubem Fonseca responde a esta
pergunta, de forma sublime, no seu livro “José”. Aqui fica a citação: “Gostar de ler e digitar palavras, seria
suficiente para a pessoa se tornar um escritor? José sabia que o mais
importante requisito era motivação, essa energia psicológica, essa
tensão que põe em movimento o organismo humano, determinando um certo
comportamento. José sabia que se o aspirante a escritor não tiver uma motivação
forte, escreverá, quando muito alguns poemas de dor de cotovelo, alguns contos,
talvez até um romance, mas logo desistirá. José estava certo de que na
realidade, a motivação de cada escritor está essencialmente ligada à sua
experiência, à sua vida, desejos, ambições, sonhos, pesadelos. Não interessa o
tipo de motivação, apenas tem que ser suficientemente forte”. É precisamente isto
que eu penso em relação a querer fazer da escrita, uma carreira. A escrita tem
que te ser orgânica e tens que ser perseverante. Não podes desistir ao primeiro
obstáculo, pois existirão, certamente, muitos obstáculos ao teu sonho.
M.L: Que balanço faz do percurso que tem feito até
agora como escritora?
A.C: Gostava de responder a esta pergunta, daqui a um
par de anos, quando já tivesse, pelo menos, mais uma história escrita.
M.L: Quais são os seus próximos projetos?
A.C: “Todas as Palavras de Amor” ainda é um
recém-nascido, que me tolda um pouco a capacidade de fazer projetos. Mas já
comecei a escrever outra história, que não quero deixar morrer…
M.L: Qual é a coisa que gostava de fazer e não tenha
feito ainda?
A.C: Sou imensamente privilegiada
nesse sentido. As coisas que mais amo, já alcancei. Tenho uma família que me
completa e dedico-me à escrita. O resto será sempre um upgrade ao que já tenho. Como viajar mais, ver mais mundo, ver mais
histórias que escrevi arrumadas entre uma capa e contracapa.
M.L: O que é que gostava que mudasse nesta altura da
sua vida?
A.C: Gostava de ter mais tempo. Tempo para as coisas mais
supérfluas, que também são fundamentais para temperar as nossas vidas.ML
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