quarta-feira, 23 de julho de 2014

Mário Lisboa entrevista... Rui Madureira

Olá. A próxima entrevista é com o escritor Rui Madureira. Interessou-se pela escrita na adolescência, e tem desenvolvido um percurso promissor como escritor que passa, essencialmente, pela literatura e pelo teatro. É também crítico de cinema no blogue "Portal Cinema", tendo começado a interessar-se pelo cinema, depois de ter visto "Titanic" (1997) de James Cameron, e, recentemente, escreveu o seu segundo livro intitulado "Depuração" que foi lançado pela recém-criada editora Coolbooks do Grupo Porto Editora. Esta entrevista foi feita no passado dia 18 de Julho.

M.L: Quando surgiu o interesse pela escrita?
R.M: O interesse pela escrita surgiu quando eu era ainda muito novo, por volta dos 15 ou 16 anos. Por essa altura comecei a escrever alguns argumentos cinematográficos que, obviamente, nunca saíram da gaveta. Mais tarde comecei a escrever alguns contos, um dos quais recebeu o terceiro prémio de um concurso literário organizado pela Faculdade de Letras da Universidade do Porto. E mais tarde ainda veio o desejo de me dedicar à escrita de romances. Percebi que alguns dos meus argumentos cinematográficos tinham potencial para se transformarem em livros, se fossem alvo de um pequeno ajuste. Foi assim que nasceu o “Abaddon”, o meu primeiro livro, e agora o “Depuração”. Basicamente, sempre quis ser um contador de histórias. Sempre quis partilhar as minhas histórias com o Mundo inteiro, de modo que a literatura foi o passo lógico a dar para atingir esse objetivo.

M.L: Quais são as suas influências nesta área?
R.M: Deixo-me influenciar essencialmente por autores do género Fantástico, como (J.R.R.) Tolkien ou J.K. Rowling. O Fantástico é o género que mais me apela e aquele em que me sinto mais à vontade enquanto escritor. Gosto da liberdade que o Fantástico proporciona ao autor, a liberdade para criar mundos diferentes, a liberdade para escrever sobre o que quer que me venha à cabeça. Mas, mais do que a literatura, o cinema é a minha grande fonte de inspiração. Foi com o cinema que cresci enquanto contador de histórias e foi com a Sétima Arte que aprendi a identificar aquilo que faz uma boa história. Por isso é que os meus livros são muito visuais. Porque tento arquitetá-los como se fossem filmes, como se fossem imagens em movimento e não propriamente palavras numa folha de papel. Filmes como “O Senhor dos Anéis” (2001-2003) e “O Exorcista” (1973), por exemplo, foram grandes influências para a construção do “Abaddon”. E o “Depuração”, que foi recentemente lançado pela editora Coolbooks, tem elementos que facilmente remetem o leitor para obras como “Poltergeist-O Fenómeno” (1982) e “Atividade Paranormal” (2007). Sem essa ligação íntima ao cinema, ser-me-ia mais difícil construir as minhas histórias.

M.L: Como escritor, escreve, essencialmente, para literatura e para teatro. Qual foi o trabalho que mais o marcou, até agora, enquanto escritor?
R.M: Não apenas por ter sido o meu primeiro livro, mas também por se tratar de uma história que já me vinha acompanhando desde os tempos da adolescência, o “Abaddon” continua a ser o trabalho que mais me marcou até à data. Foram quase dois anos a pensar exclusivamente em anjos, demónios e batalhas apocalípticas. Foi uma viagem fantástica que percorri no interior da minha própria cabeça e ainda hoje me sinto como se tivesse vivido aquelas batalhas assustadoras junto dos meus protagonistas. Essa sensação é indescritível e é um dos grandes privilégios de qualquer autor, que tem assim a oportunidade de viver múltiplas aventuras com as suas personagens.

M.L: Também é crítico de cinema no blogue “Portal Cinema” (http://www.portal-cinema.com/que foi criado em 2007. Como vê o percurso que o blogue tem feito, desde a sua criação até agora?
R.M: O “Portal Cinema” tem crescido imenso ao longo dos anos e orgulho-me muito de fazer parte da sua equipa. Começou por ser um projeto pequeno e íntimo, simplesmente para partilhar a paixão pelo cinema com meia dúzia de outros cinéfilos e depois evoluiu para algo de uma dimensão muito superior, abandonando o amadorismo e adquirindo cada vez mais contornos de projeto profissional. Ao longo dos anos, o “Portal Cinema” tem ganho um número imenso de adeptos e tem-se também destacado como um espaço de referência para quem procura críticas de cinema isentas e sérias. Os apoios ao blogue têm crescido em catadupa e tudo isto só tem sido possível graças à extraordinária dedicação do João Pinto, o administrador do blogue. Enquanto nos for possível, cá estaremos para continuar a crescer e a servir as exigências dos nossos leitores nos anos vindouros.

M.L: Começou a interessar-se pelo cinema, depois de ter visto “Titanic” (1997) de James Cameron e protagonizada por Leonardo DiCaprio e Kate Winslet. Na sua opinião, acha que esta longa-metragem tem lidado bem com a passagem do tempo, 17 anos depois da sua estreia?
R.M: O “Titanic” sempre foi um filme que suscitou reações apaixonadas por parte do público. Uns amam-no, outros odeiam-no. A verdade é que ninguém fica indiferente. Tive a oportunidade de ver o filme no cinema com 12 anos de idade e, na altura, fiquei deslumbrado. Era o espetáculo mais grandioso que alguma vez tinha visto. 17 anos mais tarde, a verdade é que ainda me deixo fascinar sempre que o revejo. Analisando-o agora com outros olhos, reconheço que tem alguns momentos de lamechice desnecessária e que nem sempre é tão subtil quanto poderia ser. Mas continua, sem sombra de dúvida, a ser um colosso cinematográfico, um dos maiores filmes da História do Cinema. A passagem do tempo não parece tê-lo envelhecido, de modo que o filme continua extremamente atual. Continua a apresentar efeitos visuais bem melhores do que muitos filmes que se fazem nos dias de hoje e continua a ser uma das fitas mais intensas e espetaculares da Sétima Arte. Nos tempos que correm, duvido que ganhasse 11 Óscares da Academia, pois os padrões mudaram ligeiramente e agora é raro ver um blockbuster atingir tanto sucesso crítico. Mas, pelo menos para mim, o “Titanic” é imortal e defendê-lo-ei com unhas e dentes até ao fim dos dias.  

M.L: Como vê, atualmente, a Cultura em Portugal?
R.M: A cultura está num estado lastimável, infelizmente. Um dos bens mais preciosos que qualquer país tem é a sua cultura, mas os nossos governantes teimam em não ver as coisas dessa forma e assassinam constantemente a alma da nação. A cultura de um país é a sua identidade. Para além do mais, a cultura serve o propósito de estimular a reflexão dos cidadãos e de espicaçar o seu desenvolvimento cognitivo, de modo que jamais se deveria olhar para a cultura como um empecilho que serve apenas para entreter meia dúzia de pessoas aos domingos de tarde. Estamos a passar por uma crise de valores que não abona a favor da cultura. Os nossos governantes só conseguem olhar para gráficos e números, e não têm a capacidade de ver que a cultura é fundamental para o equilíbrio de qualquer sociedade, dê ela lucros ou não. Já foi tempo em que as artes eram respeitadas e tidas em grande conta por quem mandava no Mundo. Hoje, infelizmente, é o dinheiro que manda. E como também ajuda manter o pessoal na ignorância para governar a bel-prazer, talvez por aí se explique também este desinvestimento na cultura portuguesa…

M.L: Gostava de fazer uma carreira internacional?
R.M: Esse é, de facto, um sonho antigo. Gostava muito de ver os meus livros editados em diversos idiomas. Sobretudo em inglês, pois decerto a ligação ao cinema ficaria mais estreita e seria mais fácil tentar obter um acordo para uma adaptação cinematográfica. Mas para se chegar a uma carreira internacional é necessário comer muita sopa, portanto tenho de dar um passo de cada vez e ver o que o futuro me reserva.

M.L: Foi membro do júri da Secção Oficial de Cinema Fantástico na edição de 2013 do Fantasporto. Como é que se sentiu ao colaborar com um festival nomeadamente dedicado ao cinema fantástico, tendo em conta que é um género que admira bastante?
R.M: Foi uma experiência fantástica porque sou fã do Fantasporto há muitos anos e não estava à espera da oportunidade quando ela me foi anunciada. O Mário Dorminsky, o Presidente do festival, fez uma apresentação do “Abaddon” alguns meses antes do festival ter início. E como gostou bastante do livro, decidiu convidar-me a integrar o júri da Secção de Cinema Fantástico desse ano. Foi muito bom. Ter a oportunidade de conviver com personalidades do cinema e com críticos de cinema de todos os cantos do Mundo durante duas semanas não surge todos os dias. De modo que me senti um pouco nas nuvens e fiquei muito grato pela oportunidade. Fiquei também feliz por ter ajudado o festival de alguma maneira, pois, a cada ano que passa, as dificuldades para o manter de pé são cada vez maiores e todos temos de batalhar para que ele permaneça bem vivo. 

M.L: Nos últimos anos, o género fantástico tem tido um destaque enorme no audiovisual (Cinema e Televisão). Tendo em conta a situação atual no cinema norte-americano, em que os estúdios apostam frequentemente em fórmulas pré-concebidas, acha que, um dia, o público vai ficar saturado deste género específico?
R.M: O cinema é feito de ciclos. Antes do fenómeno “Twilight” (2008-2012) ter trazido de volta a paixão pelos vampiros, não podemos esquecer-nos que os filmes de vampiros estavam extintos há uma data de tempo. E bastou um empurrãozinho para que eles voltassem à carga com uma força nunca antes vista. É verdade que agora o género começa novamente a ficar um pouco saturado, de modo que muito brevemente dever-se-ão fechar as portas para muitos projetos do género Fantástico. Mas mesmo que tal coisa suceda, ele há de renascer de novo, como sempre acontece. E mesmo que os grandes estúdios decidam desistir dos projetos fantásticos durante algum tempo, acredito que projetos de qualidade incontornável não deixarão de encontrar luz verde só por causa desse abrandamento. É provável que os vampiros e lobisomens adolescentes tenham os dias contados…

M.L: Que balanço faz do percurso que tem feito, até agora, como escritor?
R.M: Faço um balanço minimamente positivo. É verdade que os meus livros não têm alcançado o sucesso de vendas que eu desejaria, mas é preciso entender que estou ainda no início daquilo que pode vir a ser uma carreira de escritor e o início é sempre muito difícil para quem não tem um nome definido na indústria. Aqueles mitos de que um autor atinge o estrelato logo com o primeiro livro não passam disso mesmo: mitos. Não que não possa acontecer, mas é muito, muito raro. Para quem não é conhecido e não tem um nome estabelecido na indústria, é preciso dar pequenos passos em frente e manter a esperança. A nível crítico, pelo menos, o balanço tem sido bastante positivo. Ainda ninguém teceu comentários verdadeiramente negativos a alguma das minhas obras, muito pelo contrário. Os livros têm sido bem aceites por quem os lê e, com a força do Grupo Porto Editora que está por detrás do projeto Coolbooks, tenho esperança de que o “Depuração” chegue mais longe e de que seja apreciado por mais leitores. 

M.L: Quais são os seus próximos projetos?
R.M: Estou de momento a preparar um terceiro romance que será muito diferente do “Abaddon” e do “Depuração”. Insere-se igualmente no género Fantástico, mas tem como base a mitologia grega e tem alguns heróis gregos e os próprios Deuses do Olimpo como protagonistas. É um épico de fantasia em grande escala, que ainda se encontra numa fase muito precoce. Estou a ultimar o esqueleto narrativo para passar então à fase de escrita propriamente dita. Para além desse terceiro livro, tenho-me também dedicado cada vez mais ao teatro e espero ter a oportunidade de consumar alguns projetos enquanto ator.

M.L: Qual é a coisa que gostava de fazer e não tenha feito ainda nesta altura da sua vida?
R.M: Gostava muito de abraçar uma carreira de ator e ter a possibilidade de adquirir experiência nessa área, seja através do teatro, da televisão ou do cinema. Gostava também imenso de trabalhar numa adaptação teatral ou cinematográfica de um dos meus livros, algo que é um sonho antigo e que talvez tenha a possibilidade de se concretizar nos próximos tempos.ML

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