sexta-feira, 26 de agosto de 2016

Mário Lisboa entrevista... João Perry

Estreou-se na representação aos 12 anos de idade com a peça "Rapaziadas" no Teatro Nacional D. Maria II e tem desenvolvido um notável percurso como actor que já conta com 6 décadas de existência e passa pelo teatro, pelo cinema e pela televisão (onde entrou em produções como "Vila Faia" (RTP), "A Banqueira do Povo" (RTP), "Na Paz dos Anjos" (RTP), "Ballet Rose-Vidas Proibidas" (RTP), "Ajuste de Contas" (RTP), "Fúria de Viver" (SIC), "O Olhar da Serpente" (SIC), "O Jogo" (SIC), "Fascínios" (TVI), "A Outra" (TVI), "Deixa Que Te Leve" (TVI), "Sentimentos" (TVI), "Sedução" (TVI), "Sol de Inverno" (SIC), "Mar Salgado" (SIC), "Coração d'Ouro" (SIC). Um dos actores mais enigmáticos do meio artístico português que tanto no palco como no ecrã tem uma presença fortíssima, também tem experiência na encenação, fez parte do elenco residente do Teatro Nacional D. Maria II e brevemente pode ser visto na telenovela "A Impostora" que marca o seu regresso à TVI. Esta entrevista foi feita no Teatro Nacional São João no Porto.

M.L: Quando surgiu o interesse pela representação?
J.P: Sempre estive ligado ao teatro, o meu pai era actor e a minha avó, mãe dele, tenha feito teatro, embora eu nunca a tinha visto representar. O meu pai morreu quando eu tinha 9 anos e comecei a fazer teatro aos 12 no Teatro Nacional em Lisboa. Mas desde que me lembro sempre passava a maior parte do meu tempo nos teatros.

M.L: Quais são as suas influências, enquanto actor?
J.P: São tão variadas que nem consigo determinar quais foram os que me influenciaram mais. Mas talvez os actores e directores com quem trabalhei no início, visto nessa altura ser mais permeável a receber informação sobre como fazer.

M.L: Há algum género específico que mais gosta de fazer como actor?
J.P: Gosto da profissão no seu todo mas não destaco nenhuma das formas em especial. Teatro, cinema e televisão recorrem a métodos aparentemente diferentes de expressão mas o centro é sempre o mesmo. Todas as personagens que tenho feito acrescentaram sempre, pela positiva e pela negativa, conhecimentos que se vão reflectir em desafios futuros.

M.L: De todos os trabalhos que tem feito até agora como actor, houve algum que teve um impacto marcante em si?
J.P: Não tenho, até hoje, escolhas muito destacadas nem ligações ao que fiz anteriormente. O que fica para trás é abandonado como a pele de um réptil. Apenas me interessa o futuro. Sei que fizeram parte da minha estrutura de hoje mas não me reconheço no que fiz. No entanto, a última coisa que fiz serve-me de partida para a próxima viagem.


M.L: Entre 2000/01, protagonizou a telenovela “Ajuste de Contas” que foi exibida na RTP, na qual interpretou a personagem José Eduardo. Que recordações guarda desse trabalho específico?
J.P: Talvez a possibilidade de fazer uma revisão de situações, que eu felizmente não vivi na realidade. Nesse período apenas estive em África em (19) 64 em tournée com o Grupo Fernando Pessoa e só vi fragmentos do que se estava a passar. Todas as guerras e conflitos violentos geram situações de enorme injustiça e tenho sempre profunda aversão à falta de diálogo verbal que conduz a tais excessos.

Maria João Silveira, João Perry, Raul Solnado e o realizador Gonçalo Mourão nas gravações de "Ajuste de Contas"
M.L: Estreou-se como actor com a peça “Rapaziadas” no Teatro Nacional D. Maria II em 1953. Que balanço faz do percurso que tem desenvolvido até agora como actor?
J.P: Não tenho sobre o meu trajecto na profissão uma consciente panorâmica. Felizmente foi-me dada a possibilidade de fazer coisas e funções muito variadas, por exemplo, passando pelas dobragens e montagens de cenários e de luzes. A monotonia é uma coisa exasperante e pouco criativa. 


M.L: Como lida com o público que tem acompanhado a sua carreira há vários anos?
J.P: Lido actualmente melhor com a exposição pública por comparação com os primeiros anos. Contínuo a ser introvertido, tímido talvez. Não me reconheço como uma pessoa de grandes demonstrações de afecto. A multidão assusta-me por imprevisível que é.

M.L: Em 2014 ganhou tanto o Prémio Autores como o Globo de Ouro na categoria de Melhor Actor de Teatro pela peça “O Preço” e também ganhou em 2015 o Prémio Sophia de Melhor Actor Secundário pela longa-metragem “Os Maias-Cenas da Vida Romântica” de João Botelho. Como é a sua relação com o reconhecimento no que diz respeito aos prémios?
J.P: Acho que partem de um princípio simpático. Mas o seu efeito dura pouco e é preciso ter presente que correspondem à escolha de um grupo de pessoas e, certamente, haver quem não esteja de acordo com essa distinção.

João Perry e o seu Prémio Sophia de Melhor Actor Secundário por "Os Maias-Cenas da Vida Romântica"
M.L: Fez parte do elenco residente do Teatro Nacional D. Maria II, onde recusou por duas vezes o cargo de director. Como vê, hoje em dia, o Teatro Nacional D. Maria II?
J.P: Recusei também a direcção do São João no Porto. Não sou a pessoa indicada para um projecto de longo curso. No Nacional de Lisboa, havia também outro facto incontornável: o afecto pelo edifício. Depois das obras feitas, após o incêndio que destruiu o antigo teatro, o espaço interior, palco e público, sofreram alterações tão radicais que se tornava muito difícil aceitar dirigir, e também representar, na aberração existente.

M.L: Entre 2010/11, participou na telenovela “Sedução”, que foi a última que o Rui Vilhena escreveu para a TVI, na qual interpretou o arrogante apresentador de televisão José Carlos Faria. Em que se inspirou para interpretar esta personagem?
J.P: Vi várias séries televisivas, sobretudo americanas. Não tenho talento para caricaturar situações vigentes em Portugal nem me parecia justo nem oportuno para o texto em questão. Mas gostei muito de fazer a personagem escrita pelo Rui Vilhena, que considero um óptimo criativo nesta matéria televisiva.

M.L: Qual conselho que daria a alguém que queira ingressar numa carreira na representação?
J.P: Que tenha sempre presente que nunca há um vencedor que dure mais do que 3 ou 4 dias. Não há, portanto, espaço para o descanso. Só o trabalho constante e obsessivo leva a conseguir-se alcançar o que se sonha, por períodos de tempo mais extensos.

M.L: Qual é a coisa que gostava de fazer e não tenha feito ainda nesta altura da sua vida?
J.P: Ser rico.ML

Esta entrevista não está sob o novo Acordo Ortográfico

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