segunda-feira, 8 de setembro de 2014

Mário Lisboa entrevista... Marta Rangel

Desde muito cedo que se interessou pelo jornalismo, tornando-se numa das jornalistas mais versáteis da sua geração, com um percurso que passa, essencialmente, pela televisão. Apaixonada pelo que faz, é muito exigente com o seu trabalho e muito perfeccionista, e, actualmente, trabalha no canal Económico TV que pertence ao jornal Diário Económico. Esta entrevista foi feita no passado dia 26 de Agosto.

M.L: Quando surgiu o interesse pelo jornalismo?
M.R: Sempre que me fazem esta pergunta, costumo contar uma pequena história. Num certo Natal, quando era criança - com 5 ou 6 anos - pedi uma prenda "especial": um rádio. Embora, ainda hoje, goste muito de ouvir música, não era esse o principal objectivo, na altura. Mas, sim, o facto de o rádio ter também um microfone! Assim que desembrulhei a prenda, comecei logo a fazer pequenas "entrevistas" à família e aos amigos. E, até hoje, recordo este episódio como o primeiro sinal daquela que viria a ser a minha profissão: jornalista.

M.L: Quais são as suas influências, enquanto jornalista?
M.R: São muitas e é difícil enumerar todas. Lembro-me de assistir ao "nascimento" da SIC e de ter a Alberta Marques Fernandes como uma das grandes referências. Gosto muito da postura e do profissionalismo de pivots como a Clara de Sousa e Rodrigo Guedes de Carvalho, da SIC, do João Adelino Faria e Carla Trafaria, da RTP, e do José Alberto Carvalho e Judite de Sousa, da TVI. Também acompanho com atenção o trabalho de inúmeros jornalistas de todos os canais. A um nível mais pessoal, valorizo todas as experiências em cada uma das redacções por que passei. Na rádio, comecei na Rádio Horizonte Tejo - actualmente, Rádio Horizonte FM - onde aprendi como se escreve uma notícia, grava um "RM" (Registo Magnético) ou edita um noticiário. De seguida, senti necessidade de evoluir profissionalmente e fui estagiar para a TSF onde aprendi como funciona uma agenda de redacção e tive as primeiras experiências jornalísticas a nível nacional. Depois, percebi que a minha paixão era, realmente, fazer televisão. Estagiei na TVI, sobretudo, no departamento multimédia e, em seguida, na SIC, onde tive a oportunidade, mais tarde, de ficar a contrato. Considero que a SIC foi a minha grande "escola", onde comecei a fazer jornalismo a sério, onde fui - como se costuma dizer na gíria da profissão - "atirada aos bichos". Tive a sorte de ter um coordenador, em particular, que apostou em mim, o Daniel Cruzeiro, e me deu a oportunidade de fazer "estórias" para a equipa de fim-de-semana, que me marcaram e recordo até hoje. A partir daqui, nunca mais parei. Colaborei com o Expresso online e, alguns meses depois, comecei a trabalhar para uma produtora chamada Companhia de Ideias, onde, durante 2 anos, produzi e coordenei conteúdos para vários programas da RTP, como o "Diário da Europa", "Mais Europa", "Sociedade Civil" e "Grandes Livros". De seguida, surgiu o convite para a Benfica TV: comecei como repórter, tive a grande estreia como pivot e, alguns meses depois, tornei-me coordenadora de redacção. Recordo, com carinho, um dos maiores desafios que tive naquela casa: coordenar a emissão especial da final da Taça da Liga, no Algarve, onde o Benfica ganhou ao Sporting, já nos penaltis! Desde 2009, trabalho no Económico TV onde tenho evoluído como jornalista, sobretudo, nos conteúdos económicos e financeiros, e como pivot, não só de informação diária, como de debates, fóruns ou grandes entrevistas, como faço no programa "Conversas com Vida". O Económico tem também, há quase 2 anos, uma parceria com a RTP através da qual os jornalistas fazem análise de mercados financeiros para o "Bom Dia Portugal" (RTP1) e "Jornal das 12" da RTP Informação. Este tem sido um grande desafio, que abraço com muito gosto.

M.L: Como jornalista, trabalha, essencialmente, na televisão. Gostava de trabalhar mais em outros meios de comunicação como, por exemplo, a rádio?
M.R: Como referi, anteriormente, já trabalhei em rádio, mas continuo a sentir-me mais "em casa" na televisão. Gosto da necessidade de rapidez, do imediatismo, dos directos, do trabalho em equipa, de poder contar com todas as pessoas - tão importantes - que estão nos "bastidores" como a produção, a realização, os repórteres de imagem, editores, continuidade, maquilhadoras, entre tantos outros! É difícil apontar o que não gosto! É verdade que, muitas vezes, é duro ter de chegar à redacção às 5h ou 6h da manhã, preparar entrevistas e programas em casa, carregar tripés às costas (para ajudar os repórteres de imagem a "dividir o mal pelas aldeias"), lidar com um nível de stress elevado... Mas, como diz o ditado, "quem corre por gosto, não cansa". Ou - diria eu - cansa-se menos!

M.L: Na televisão, trabalha, actualmente, no canal Económico TV, que pertence ao jornal Diário Económico. Que balanço faz do tempo em que trabalha no canal?
M.R: Faço um balanço muito positivo. Quando cheguei, há 5 anos, tinha uma escassa experiência em assuntos económicos. Hoje em dia, estou perfeitamente à vontade com temas como o Orçamento de Estado, a execução orçamental, a crise na Banca, o mercado accionista, os juros da dívida, o programa de ajuda externa, etc. Claro que, boa parte desta aprendizagem, devo a todos os meus colegas, coordenadores e directores com quem tenho aprendido e troco ideias todos os dias. Mas, para além disso, ser jornalista é ter de estudar um pouco todos os dias: ler muitos jornais, pesquisar informação adicional, tirar dúvidas com economistas e analistas de mercado... É um esforço diário para tentar ser cada vez melhor. E é também isso que me dá um imenso prazer!

Para além dos conteúdos, também tenho experimentado outros formatos como pivot. Na Benfica TV, já tinha apresentado telejornais e fóruns de opinião, mas, no ETV, tenho a oportunidade de moderar debates e fazer grandes entrevistas. Destaco, por exemplo, o facto de ter entrevistado Pedro Passos Coelho, quando era candidato à liderança do PSD ou António Pires de Lima, antes de ser nomeado ministro da Economia. No programa "Conversas com Vida" também tenho tido oportunidade de conhecer e conversar com figuras de renome, de todos os quadrantes da sociedade portuguesa, desde a Simone de Oliveira, ao Comendador Rui Nabeiro, passando pelo psiquiatra Júlio Machado Vaz ou pelo ex-ministro Bagão Félix, entre muitos outros.

Para além disso, voltei a escrever para um jornal - o Diário Económico - com alguma frequência, o que é muito positivo, para mim, enquanto jornalista, já que tenho a oportunidade de exercitar outro tipo de escrita diferente da linguagem da televisão.

M.L: O Económico TV existe, desde 2010. Como vê o percurso que o canal tem feito, desde a sua fundação até agora?
M.R: O ETV tem evoluído, enquanto canal de referência no segmento de economia e mercados financeiros, e tem também conquistado outro tipo de público, menos habituado a estes temas. Isso nota-se, sobretudo, no programa "Assembleia Geral", um fórum onde os telespectadores participam ao telefone, via e-mail ou Facebook. De alguma forma, penso que o ETV encontrou uma oportunidade na crise porque, com o programa de ajuda externa, alguns conceitos aparentemente difíceis, que passavam despercebidos à maioria dos portugueses - como os juros da dívida, as novas soluções na Banca ou o Ecofin, em Bruxelas - passaram a fazer parte do dia-a-dia de todos nós.

Como qualquer canal "jovem", acredito que o ETV ainda tem uma grande margem para crescer e alcançar a notoriedade do "irmão" Diário Económico, um jornal de referência com 25 anos de existência.

M.L: Qual foi o trabalho que mais a marcou, até agora, durante o seu percurso como jornalista?
M.R: Foram vários e espero ter muitos mais! Lembro-me, por exemplo, de uma reportagem que fiz na SIC sobre dois irmãos deficientes profundos, que viviam sozinhos, depois da mãe ter falecido, entregues à própria sorte. A Segurança Social tinha sinalizado a situação, mas estava longe de resolvê-la. Assim que a SIC emitiu a reportagem, o caso foi logo solucionado: os irmãos foram encaminhados para uma instituição, onde ficaram a viver de forma digna e, em segurança. É, nestas alturas, que sinto que o jornalismo tem poder para mudar o Mundo. Nem que seja o Mundo de alguém!

Quando fiz os programas "Diário da Europa" e "Mais Europa" para a RTP, através da Companhia de Ideias, acompanhei, em reportagem, toda a presidência portuguesa da União Europeia. Lembro-me, por exemplo, de ter ido a uma cimeira com a Rússia, onde estava Vladimir Putin e a outra com os Estados Unidos, onde participaram Tony Blair, como enviado especial da UE, e Condoleezza Rice, então secretária de estado de George W. Bush. Ambas com elevados níveis de segurança, com helicópteros a sobrevoar a zona e snipers nos telhados. Na cimeira com os EUA, houve um episódio caricato. Eu estava junto às barreiras de protecção, a tentar "abrir caminho" pelo meio dos outros jornalistas, quando vejo uma pessoa, aparentemente perdida, sem ter por onde passar. Era Tony Blair! Ainda consegui trocar duas ou três palavras com ele e indicar-lhe o caminho correcto. Mas, sobretudo, fiquei em êxtase por estar ali, cara a cara, com o antigo primeiro-ministro britânico. Parecia que tinha visto o Brad Pitt!

No ETV, tive oportunidade de ir à Estónia, quando aderiu à zona euro e foi muito interessante conhecer uma realidade e uma cultura ainda muito influenciada pela Rússia. Muitas entrevistas que tenho feito no ETV também me têm marcado pela positiva. Às vezes, até, de forma mais emotiva, quando ouço histórias de vida tão ricas e preenchidas. Outras, pelo desafio de ter de entrevistar alguém mais "difícil", de ter de "arrancar" uma declaração, uma notícia.

Mais recentemente, voltei a sentir aquele "friozinho" no estômago - típico do "nervoso miudinho" - quando fiz o primeiro directo para a RTP no âmbito da parceria com o Económico. Mas são nervos bons, daqueles que valem a pena sentir!

M.L: Como vê, actualmente, a Comunicação Social em Portugal?
M.R: A comunicação social, tal como o país, está em crise. E, inevitavelmente, preocupa-me. Claro que, em quase todas as estruturas, é possível eliminar desperdícios, fazer "mais com menos". Mas tem de haver limites. Acredito que é preciso dar oportunidade aos mais jovens - como eu tive, quando comecei há 14 anos - mas a experiência dos mais velhos não pode ser descartada. Na minha opinião, é preciso haver meritocracia em muitas empresas, em Portugal, e não falo só da comunicação social. É necessário valorizar o bom trabalho - a qualidade, não a quantidade - e os melhores profissionais. Acredito também que uma liderança, que dá o exemplo, é determinante em qualquer empresa. Costumo utilizar, com frequência, uma frase que a minha mãe costuma dizer: "para saber mandar, é preciso saber trabalhar".

M.L: Em Agosto de 2008, frequentou o curso “Guionismo-A Estrutura em 3 actos, o diálogo e as personagens” que foi promovido pela Nextart. Gostava de, um dia, apostar numa carreira na área da escrita?
M.R: Sempre gostei muito de escrever, desde criança. Quem sabe, um dia, escrevo um livro! Depois, só fica a faltar plantar a árvore e ter um filho!

M.L: Qual conselho que daria a alguém que queira ingressar numa carreira na área do jornalismo?
M.R: Muito trabalho, muita dedicação, persistência e espírito de sacrifício. Muito "amor à camisola", vontade de aprender e humildade. E, antes disso tudo, ter a certeza - absoluta - de que quer mesmo ser jornalista. Não vale a pena entrar na profissão porque quer "ser famoso" ou aparecer na televisão. Isso não é jornalismo. 

M.L: Que balanço faz do percurso que tem feito, até agora, como jornalista?
M.R: Felizmente, tenho tido a sorte de conseguir manter-me na área desde que comecei. Gosto de acreditar que tenho, também, algum mérito. Sou muito exigente com o meu trabalho - e com o dos outros - e muito perfeccionista. Acho sempre que posso fazer melhor e não gosto de me sentir estagnada, por isso, preciso de ter, com frequência, novos desafios. Comecei como repórter, tornei-me também pivot há cerca de 7 anos e tive a oportunidade de coordenar equipas em duas redacções: Companhia de Ideias e Benfica TV. Na minha opinião, o maior desafio de ter um cargo de chefia não é distribuir trabalho, mas sim, gerir pessoas, com diferentes experiências e sensibilidades. Perceber as capacidades de cada um dos membros da equipa, saber potenciá-las e dar-lhes margem de evolução e, ao mesmo tempo, identificar as dificuldades e ajudar a ultrapassá-las. Depois, é necessário ter também "inteligência emocional": perceber quando o colega está num dia bom ou mau, saber fazer críticas construtivas e, sobretudo, saber elogiar.

Comecei a trabalhar muito jovem e já sou jornalista há 14 anos, 10 dos quais em televisão. Não foi sempre um "mar de rosas". Claro que há dias difíceis, em que até nos passa pela cabeça "mudar de vida". Mas nunca quis - nem quero - desistir da profissão. Acredito que ainda tenho muita margem para crescer e evoluir e espero que surjam mais oportunidades.

M.L: Quais são os seus próximos projectos?
M.R: Em paralelo com o meu trabalho de jornalista no Económico, também dou media trainings, com alguma frequência. Para quem não sabe o que é, trata-se de ensinar e "treinar" pessoas a lidar com jornalistas, por exemplo, a saberem o que responder e como estar durante uma entrevista. A exposição mediática continua a ser mais associada à classe política ou a responsáveis de empresas, mas, hoje em dia, é extensível a quase todas as áreas. Não há uma segunda oportunidade para criar uma primeira boa impressão. 

M.L: Qual é a coisa que gostava de fazer e não tenha feito ainda nesta altura da sua vida?
M.R: A nível profissional, quero continuar a trabalhar em televisão e gostaria que a minha carreira pudesse evoluir para outros patamares. Confesso que, por vezes, sinto falta de alguma meritocracia, mas acredito que, um dia, vai chegar. Até lá, vou continuar, todos os dias, a dar o meu melhor.ML

A pedido da entrevistada, esta entrevista não foi convertida sob o novo Acordo Ortográfico.

Fotografia: David Carvalho

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