M.L: Quando surgiu o interesse pela escrita e pela
psicologia?
R.M: O meu percurso foi, desde que
me lembro, atípico. A Vida consegue sempre surpreender-me e desafiar-me, para
além do que eu consigo imaginar ou planear. Acho que posso dizer que não fui eu
que me interessei pela escrita ou pela psicologia. Foi ao contrário. De
repente, a escrita e a psicologia interessaram-se por mim! Licenciei-me em
Matemáticas Aplicadas à Investigação Operacional e Engenharia de Sistemas. Aos
vinte anos, quando já estava no IST a fazer o mestrado em Engenharia de Sistemas,
a vida mostrou-me, pela primeira vez, que os planos que fazemos não têm grande
utilidade. De um dia para o outro, dei por mim a percorrer o país a fazer marketing político (logo eu, que nunca
me tinha interessado por política). Este trabalho, que durou seis meses, foi
provavelmente a formação mais transformadora e rica que tive. Do marketing político, passei para a
organização e produção de eventos, onde se destacam as comemorações de Elevação
de Sintra a Património Mundial e a direção de produção do Dia de Inglaterra na
Expo 98. No entretanto, criei uma empresa de transformação de camiões TIR para
eventos e road-shows, fiz produção
musical, aprendi cinema com a produtora Rosi Burguete e fui assistente de realização.
Acabei por aterrar na publicidade. Dei aulas, estudei grafologia e trabalhei em
vários projetos sociais. Quando me cansei da publicidade, convidaram-me para
criar os conteúdos para um programa de televisão. Sem saber ao que ia, fui. Descobri
uma nova paixão. Fui coautora de vários formatos infanto-juvenis, coordenei o “Disney
Kids” (SIC), durante um ano e especializei-me em conteúdos infanto-juvenis. A
escrita tornou-se, sem eu dar por isso, na minha profissão. Por coincidência, ou
não, integrei a equipa de escrita da revista “XIS”, com quem colaborei,
regularmente, durante três anos. Fui cronista na revista “Olá Semanário!” e
comecei a escrever telenovelas. Um
artigo que escrevi para a “XIS” sobre a alegria, fez-me descobrir uma nova
paixão: os Palhaços do Hospital. Fui ao Brasil e, numa consequência de felizes
encontros, construí com um grupo de pessoas fantásticas, o projeto Operação
Nariz Vermelho. Tornei-me numa especialista em palhaços e a minha função
levou-me a voltar a estudar. Senti que a licenciatura em Psicologia era
essencial para o meu trabalho. Uma nova aventura que se tornou numa nova
paixão. Ao longo de sete anos, dediquei-me de alma e coração a este projeto. Em
simultâneo, escrevi e produzi teatro ("Eu Ligo-te" foi, talvez, a
peça que mais gostei de escrever). Ajudei a criar o projeto “Caras” em Angola,
cuja direção editorial esteve a meu cargo, durante três anos e desenvolvi
vários projetos educativos. Neste contexto escrevi um livro "Livro para
saber o que as raparigas pensam" e criei a marca Caixa de Tempo com
jogos pedagógicos. Sem ter planeado, transformei-me em editora. Durante este
tempo, a escrita para ficção nunca parou e assinei vários projetos para todos
os canais: “Louco Amor” (TVI), “Dei-te Quase Tudo” (TVI), “Cuidado com Elas” (SIC), “Campeões e Detetives” (TVI), “Maka Hotel” (TV Zimbo, Angola), “Câmara
Café” (RTP), “Detetive Maravilhas” (TVI), entre outros. No
último ano, tenho dedicado grande parte do meu tempo, a conjugar a escrita com
a psicologia, no projeto "A Verdade de Cada Um", um programa para
adolescentes na TVI, onde, pela primeira vez, me apresentei à frente das
câmaras. Ao nível académico, estou a preparar o meu doutoramento e, no último
ano, integrei uma equipa pedagógica de intervenção social na Roménia, a convite
da CE.
M.L: Quais são as suas influências nestas duas áreas?
R.M: O que me influência em
qualquer uma destas áreas é a Vida. O que vivo, o que aprendo, o que me
apaixona. Sou viciada em investigação e em aplicar o que estudo na vida com o
objetivo de acrescentar algo de novo e útil para quem usufrui, de alguma forma,
do meu trabalho.
M.L: Como escritora, escreveu para teatro, televisão e
literatura. Gostava de, um dia, escrever para cinema?
R.M: Não é uma das minhas metas. Já
escrevi um telefilme em parceria com o Tozé Martinho, já escrevi alguns filmes
publicitários, mas não tenho especial ambição em escrever para cinema. Gosto de
Histórias. Gosto de escrever Histórias que toquem as pessoas. Não faço questão
que passem no cinema.
M.L: Qual foi o trabalho que mais a marcou, tanto como
escritora e como psicóloga?
R.M: Ser mãe. É o meu principal
trabalho, o meu maior desafio e o que mais me faz crescer como ser humano.
Educar ajuda-nos a aprender a relativizar as situações, a dar importância ao
que é realmente importante e a colocar em causa as nossas crenças, aprendendo,
diariamente, a olhar para as situações por outro ponto de vista. Todas estas
experiências são profundamente enriquecedoras, quer na atividade, enquanto
guionista, quer na atividade, enquanto psicóloga.
M.L: Entre 2002 e 2003, escreveu, juntamente com Tozé
Martinho e Ana Rita Martinho, a telenovela “Amanhecer” que foi exibida na TVI.
Que recordações guarda desse trabalho?
R.M: "Amanhecer" foi a
telenovela que mais gostei de escrever. Talvez por ser a primeira. Foi um
trabalho de grande paixão e entusiasmo. Os últimos vinte episódios
transformaram-se num grande desafio. O Tozé Martinho teve uma complicação
cardíaca e foi hospitalizado. Para além da natural preocupação com a sua saúde,
havia a necessidade de cumprir com os rigorosos prazos de entrega de episódios.
Dadas as contingências da ocasião, tinha de ser eu a assumir o trabalho. No
último mês, escrevi, sozinha, um episódio por dia. Fica para sempre, na minha
memória, a responsabilidade que senti e a alegria de ter conseguido
corresponder às expectativas das pessoas que confiaram em mim.
M.L: Como vê, atualmente, a Cultura e a Psicologia em
Portugal?
R.M: A Cultura de um país espelha o
próprio país. Na conjuntura atual, podemos olhar para a nossa Cultura como
exercício de reflexão. Talento é algo que não nos falta, as novas gerações
estão a propor novas formas de comunicação e de expressão mais sustentáveis e
democráticas e continuamos, massivamente, a dar mostras que somos um povo que
não dispensa eventos culturais. A adesão aos festivais de Verão, apesar da
crise, é uma prova irrefutável disso. A Cultura está, como o país, à procura de
novos paradigmas mais sólidos e sustentáveis. Acho que não sei responder à
segunda parte da pergunta. Nunca olhei para a Psicologia com esta perspetiva.
Para mim, a Psicologia é uma ferramenta que nos ajuda a compreender melhor os
mecanismos emocionais do ser humano. Em alturas de crise as pessoas
questionam-se mais e, nessa vertente, é possível que haja mais pessoas
interessadas em descobrir como lidar melhor consigo próprias e com a
adversidade.
M.L: Também têm experiência na Comunicação Social.
Entre a escrita, a Psicologia e a Comunicação Social, em qual destas funções em
que se sente melhor?
R.M: Nunca gostei de rótulos, por
achar que são redutores. A escrita, a Comunicação Social e a Psicologia têm,
para mim, um denominador comum. É esse denominador comum que me move: o de
contribuir, através do meu olhar e das minhas experiências, de uma forma não
intrusiva, para trazer novos pontos de vista e novos paradigmas que possam ser
úteis. Acredito que é através da comunicação e da troca de ideias que todos
evoluímos. É esse o propósito do meu trabalho, independentemente da forma
que utilizo para o desenvolver.
M.L: Qual o conselho que daria a alguém que queira
ingressar numa carreira seja na escrita ou na psicologia?
R.M: Acredito que o que nos move, quando
decidimos ingressar numa carreira, é algo muito forte e pessoal que nos faz
encontrar a força necessária para não desistirmos perante a adversidade. Seja
qual for a área, contando que exista uma motivação profunda e força de vontade,
devemos perseguir os nossos sonhos e concretiza-los, mesmo que aos olhos dos outros,
o sucesso seja improvável. A grande aprendizagem não está nos sucessos que
podemos alcançar, mas sim nos obstáculos que se escondem pelo caminho.
M.L: Que balanço faz do percurso que tem feito até
agora como escritora e como psicóloga?
R.M: Sou muito grata à vida em
todos os aspetos. Olhando para trás, vejo nas derrotas, as melhores lições. Nos
momentos difíceis, as oportunidades que tive para me tornar mais forte e nos
sucessos… as oportunidades de compreender o meu sentido de vida. Quando se fala
em balanço, imagino um livro de contabilidade com o "deve" de um lado
e o "haver" do outro. Acho que tudo o que sou e fiz, devo às minhas
paixões e às pessoas que amo e aquilo que tenho na coluna do "haver"
é igual a tudo o que "devo". Em contas de merceeiro, o balanço é
zero. E isso faz-me sentir muito realizada.
M.L: Quais são os seus próximos projetos?
R.M: Há vinte anos, decidi
trabalhar por conta própria nas áreas de comunicação e educação. É nestas áreas
que centro os meus projetos. Para além dos projetos profissionais que vão
surgindo e dos quais dependem o meu sustento e o da minha família, tenho em
paralelo, como projeto pessoal, durante os próximos quatro anos, fazer o
doutoramento.
M.L: Qual é a coisa que gostava de fazer e não tenha
feito ainda?
R.M: Há milhares de coisas que
gostava de fazer e que ainda não fiz. Interessa-me muito a pesquisa e
investigação no âmbito da Física Quântica e gostava de aprofundar os meus
conhecimentos na área de forma a poder contribuir para o desenvolvimento da
mesma.
M.L: O que é que gostava que mudasse nesta altura da
sua vida?
R.M: Gostava de
conseguir fazer o meu trabalho com mais eficácia e em menos tempo. Não quero
deixar de abraçar os desafios profissionais, nem posso, por questões
financeiras, ter menos trabalho. Mas gostava de ter mais tempo para me divertir
e tirar partido de outros prazeres da vida.ML
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