M.L: Como é que surgiu o interesse pela representação?
I.L: A minha família, de uma forma ou de outra,
andou sempre por perto das artes. O meu avô materno esteve ligado ao mundo do espetáculo,
durante muitos anos e também é uma pessoa que escreve e que, a nível local,
encenou e representou algumas vezes. A minha mãe, nunca tendo enveredado por
uma carreira profissional, era muito talentosa na representação, tendo tido
várias experiências ao nível do teatro amador e participando, inclusivamente,
num programa televisivo na década de 80, a representar. Dessa participação
surgiu um convite para se profissionalizar como atriz, o que, na altura, por
questões pessoais, optou por não fazer. Assim, a profissionalização na área da
representação é uma demanda pessoal, mas que tem como início uma sensibilidade
e proximidade artísticas que sempre existiram a nível familiar. A representar,
comecei na escola secundária, com 15 anos, exatamente no momento em que,
simultaneamente, fui para um curso de atores na APOIARTE-Casa do Artista.
M.L: Quais são as suas influências, enquanto atriz?
I.L: A minha descoberta da representação começa no
Teatro. Comecei a ir ao Teatro em criança, com a minha família. A primeira peça
que me lembro de ver foi no Teatro Aberto, tinha eu aproximadamente 10 anos.
Era uma peça com a Alexandra Lencastre e o João Perry e lembro-me de ficar
muito impressionada com o trabalho dos atores. Lembro-me, também, de ver
representar e admirar muitíssimo a Eunice Muñoz, o Ruy de Carvalho, a Teresa
Gafeira, entre outros. Depois, claro, o cinema, como todos os jovens, também me
movia muito. Desde cedo comecei a admirar atores que ainda hoje são grandes
referências para mim, sendo eles, entre outros: Charlie Chaplin, Buster Keaton,
o Sean Penn, a Judi Dench, a Meryl Streep, o Al Pacino, o Jack Nicholson, o
Roberto Benigni, a Isabelle Huppert... São vários, felizmente, os atores que me
inspiram e que me fazem pensar a arte da representação.
M.L: Durante o seu percurso como atriz fez teatro e
televisão, mas nunca cinema. Gostava de trabalhar neste género?
I.L: Claro que sim. Gostava muitíssimo. Tive
apenas uma experiência, ainda na Escola Superior de Teatro e Cinema,
participando numa curta-metragem de um colega espanhol que estava cá a fazer um
ano de cinema, o Amaury Santana. Foi muito interessante e deixou muita vontade
de repetir, desta feita a nível profissional. Em Portugal, o núcleo de pessoas
que trabalham em cinema é bastante restrito e a produção cinematográfica,
apesar de existir e cada vez com mais qualidade, está ainda longe do que aquilo
a que eu gostaria de assistir. Principalmente em termos da quantidade de projetos.
Neste momento, com a crescente falta de apoio à Cultura, não vislumbro uma melhoria
desta situação, mas desejo profundamente que haja. Que consigamos inverter esta
situação. Temos muito bons profissionais em Portugal: aqueles que já trabalham
na área e muitos que ainda não tiveram essa oportunidade, mas que, a tê-la,
poderão, seguramente, ajudar a firmar o nosso País no panorama do cinema
europeu.
M.L: Qual foi o trabalho num destes géneros que a
marcou, durante o seu percurso como atriz?
I.L: Com todas as experiências que temos
aprendemos coisas e crescemos, enquanto atores e seres humanos. Mas, de
repente, ocorre-me, por exemplo, um espetáculo em que fui muito feliz, enquanto
atriz: o “Teatro-Clip”, do Teatro da Garagem, escrito e encenado por Carlos J.
Pessoa em 2007/2008.
M.L: Além da representação também é diretora de atores
e professora. Qual destas funções em que se sente melhor?
I.L: Gosto genuinamente de todas as funções que
desempenho: atriz, professora ou diretora de atores. Não exerço nenhuma delas
por acidente. Já na altura da minha formação, optei por uma formação que me
permitisse adquirir conhecimentos e ferramentas para estas diferentes áreas.
Fiz o curso de atriz da Escola Superior de Teatro e Cinema e depois segui para
a Licenciatura em Teatro e Educação. Comecei a dar aulas, quando ainda estudava
no Conservatório e foi do meu trabalho no ensino que passei para a direção de atores.
Na altura, a Maria Henrique conheceu o meu trabalho ao nível da educação e
convidou-me para trabalhar com ela. Gosto muito do que faço. Costumo dizer que,
enquanto atriz, nos divertimos mais, enquanto que como Professora ou Diretora
de Atores, temos do nosso lado, acima de tudo, a responsabilidade e a
generosidade necessária para poder trabalhar em função dos outros. Mas
aprendemos sempre, em qualquer das funções, para qualquer uma das outras.
M.L: Entre 2008 e 2009 fez a direção de atores em
parceria com Maria Henrique da telenovela “Olhos nos Olhos” que foi produzida
pela Plural (ex-NBP) para a TVI. Que recordações guarda desse trabalho?
I.L: Foi a minha descoberta da direção de atores,
por isso será sempre especial. Aceitei o convite da Maria Henrique para
trabalhar com ela e esta foi a produção em que me deparei, pela primeira vez,
com a engrenagem do que é fazer televisão diariamente, por detrás das câmaras.
Foi o início de um percurso que se mantém até hoje. Estou grata a todos os que
me ajudaram a perceber e a integrar-me na “máquina da caixinha mágica”. Algumas
das pessoas com quem trabalhei nessa produção, ainda trabalham comigo hoje. E é
um prazer. Todos os dias percebo que há mais a aprender.
M.L: Qual foi o momento que mais a marcou, durante o
seu percurso como atriz?
I.L: É difícil especificar isso. Como já disse
antes, todas as experiências, enquanto atores, nos acrescentam alguma coisa. É
como na vida. É feita de experiências e aprendizagens e todos os processos são
diferentes uns dos outros e, portanto, potenciadores de evolução. A título de
exemplo, refiro a primeira vez que representei fora de Portugal, em Bucareste,
na Roménia, com o espetáculo que já referi antes: “Teatro-Clip”. Foi muito
especial, o contato com um público muito diferente, com cultura e língua
bastante diferentes, e sentir o carinho e felicidade com que o público nos
recebeu. É maravilhoso sentir que o que fazemos cá é admirado e entendido por
pessoas com referências e experiências tão diferentes… e é que me apaixona na Arte
e no Ser Humano em geral... Independentemente dos contextos de cada um, as
grandes questões existenciais e artísticas, a sensibilidade e a inteligência
são universais. E o Teatro, como outras esferas artísticas, permite-nos
comunicar instintivamente com qualquer pessoa, de qualquer parte do Mundo.
Poderia falar de muitos outros momentos, mas há que tentar ser sucinta…!
M.L: Como vê atualmente o teatro e a ficção nacional?
I.L: Acho, tal como referi relativamente ao
Cinema, que temos excelentes profissionais: tanto no Teatro, como na Televisão
ou no Cinema. Gostava que o nosso País tratasse melhor as Artes e os seus
artistas e que investisse na formação de públicos. Gostava muito que se tivesse
consciência de que as Artes não são acessórias: são fundamentais para a
educação e desenvolvimento social, político e humano de um povo e, por
conseguinte, de um País. Acredito nos profissionais com quem trabalho
diariamente. Acredito em todos aqueles que, tantas vezes, aplaudo. E acredito
muito nas pessoas que cada vez mais vão ao Teatro e ao Cinema, a exposições, a
concertos, etc. Muitas mais usufruiriam das Artes, desde que elas tivessem
acesso, tanto no que diz respeito à sensibilização, como no que diz respeito às
questões práticas e financeiras.
M.L: Gostava de fazer uma carreira internacional?
I.L: Claro que sim. A internacionalização de qualquer
profissional aumenta o espetro de oportunidades ao nível da aprendizagem e da
riqueza de experiências. Quanto mais longe vamos geograficamente, mais
diferentes serão as pessoas e os métodos de trabalho a que temos acesso. Para
além disso, viajar é, para mim, essencial. Portanto, unir isso à minha
profissão será sempre um enorme prazer.
M.L: Recentemente fez a direção de atores em parceria
com António Melo da telenovela “Louco Amor” que atualmente está em exibição na
TVI. Que balanço faz do trabalho que desempenhou neste projeto?
I.L: “Louco Amor” foi um projeto muito especial
que ficará para sempre como uma referência do que é trabalhar com um conjunto
de pessoas marcantes. É raro encontrar-se uma equipa técnica, de produção e um
elenco recheados de pessoas com quem é tão bom trabalhar. Fazer televisão não é
fácil, são muitas horas, o ritmo é avassalador e são, na minha opinião, sem
dúvida, as pessoas que fazem com que os desafios diários se transformem em
metas construtivas. Esta produção foi especialíssima no que a isso diz
respeito. E não querendo nem podendo destacar ninguém, pois seria injusto
relativamente a tantas pessoas que teria de nomear, não posso deixar de fazer
uma especial referência ao Tó Melo. Conheci-o, quando fazia assistência de encenação
ao Almeno Gonçalves em “Os Portas”, uma produção da Sola do Sapato em que o Tó
entrava como ator. Na altura, ele convidou-me para trabalhar com ele e
continuamos a trabalhar juntos até hoje. O Tó é um grande companheiro de
trabalho e transformou-se num amigo muito forte, que sinto que conheço desde
sempre. É um excelente ator e um homem que percebe muito de atores, de
dramaturgia, de televisão e que é um ser humano muito bonito e justo. Tenho,
inequivocamente, de lhe agradecer por tudo o que tenho aprendido com ele, a
nível profissional e humano.
M.L: A telenovela é da autoria de Tozé Martinho com
quem já trabalhou anteriormente na telenovela “Sentimentos” que foi exibida na
TVI entre 2009 e 2010 da qual também desempenhou a função de diretora de
atores. O que a cativa na escrita dele?
I.L: O Tozé Martinho é um autor que investe muito
na emocionalidade e complexidade humana das histórias e das suas personagens. E
isso é muito bom ao nível da empatia com a história e com as personagens a que
os atores dão vida.
M.L: “Louco Amor” foi protagonizada por Nicolau
Breyner. Como foi trabalhar com ele?
I.L: Conhecer e trabalhar com o Nicolau foi um
prazer muito grande. É outra pessoa que me marcou muito positivamente e que
ficou registada no meu património de afetos. Ele é, indubitavelmente, um
“monstro da representação” e um grande homem de Televisão. Muitos lhe chamam o
“pai das telenovelas” e com toda a legitimidade. A atual Plural é uma sucedânea
da Nicolau Breyner Produções. O que a ficção nacional é hoje é um fruto do que
pessoas como ele iniciaram e pelo qual lutaram, durante muito tempo. Ainda hoje,
ele é uma referência para todos e continua a partilhar a sua experiência e
conhecimentos com todos aqueles que com ele se cruzam. Para além disso, é uma
pessoa de quem é muito fácil gostar.
M.L: Nicolau Breyner tem 72 anos de idade e 52 de
carreira. Como vê o percurso que ele tem feito até agora?
I.L: Como é de conhecimento público, o Nicolau tem
um percurso riquíssimo, enquanto ator, realizador, encenador, produtor e todas
as outras funções que ao longo destes anos desempenhou, de forma inovadora, à
frente do seu tempo, com um talento e capacidade de trabalho inquestionáveis e
admiráveis. O Nicolau... é o Nicolau e todos sabemos do que falamos.
M.L: Como tem sido a reação do público a este projeto
até agora?
I.L: Felizmente, muito boa. É uma novela que o
público acarinha e segue, reconhecendo a sua qualidade, em todos os setores.
M.L: Recentemente, as telenovelas “Remédio Santo” da TVI
e “Rosa Fogo” da SIC foram nomeadas para o Emmy Internacional na categoria de
Telenovela. Como vê este reconhecimento internacional?
I.L: A prova do que disse anteriormente: temos
excelentes profissionais em Portugal. E se fazemos o que fazemos com os poucos
recursos que temos, imagine-se o que se faria com mais oportunidades e
condições!
M.L: Qual foi a pessoa que a marcou, durante o seu
percurso como atriz?
I.L: Não posso falar só de uma pessoa. Teria de falar de várias. Todas
aquelas que me ensinaram ou fizeram descobrir coisas novas e mais profundas e
me permitiram ir crescendo como profissional e pessoa. Agradeço a todas de
forma muito genuína. Elas sabem quem são. Sempre fiz questão disso.
M.L: Qual o conselho que daria a alguém que queira
ingressar numa carreira na representação?
I.L: Que tenha muita certeza de que é isso que
quer e que esteja preparado para todas as dificuldades, ilusões, injustiças,
falta de segurança e de estabilidade que esta profissão acarreta ou pode
acarretar. Tal como diz o (Rainer Maria) Rilke nas “Cartas a Um Jovem Poeta”,
quando o jovem lhe pergunta como poderá saber se deve ou não prosseguir uma
carreira de escritor: “experimenta não o fazer, se conseguires, é porque este
não é o teu caminho”. Fiz esta pergunta a mim mesma várias vezes e acabei
sempre por perceber que esta opção era inequívoca, pois fruto de uma
necessidade íntima. Se assim for que se siga em frente, com muita força,
coragem e dedicação. É a única forma de o fazer.
M.L: Que balanço faz da sua carreira?
I.L: Estou feliz com o meu percurso. Tenho
trabalhado sempre e em diferentes áreas. Não me posso queixar. Desejo fazer
muitas coisas, desejamos sempre. E ainda bem. O caminho é longo, para isso
mesmo. Talvez neste momento sinta a necessidade de desempenhar mais vezes a
função de atriz, em paralelo à direção de atores. Adoro dirigir colegas e quero
continuar a fazê-lo sempre, mas preciso de, de vez em quando, ir libertando
energias e fazendo a manutenção e o investimento nas minhas ferramentas de atriz.
M.L: Quais são os seus próximos projetos?
I.L: Vou começar o ano com um grande desafio: a
minha primeira encenação. Parto no dia 04/01 para S. Miguel, nos Açores, para encenar
um texto do João Matos e da Raquel Palermo. Paralelamente, vou dar formação à
comunidade de lá (atores e não atores). Estou muito entusiasmada com esta
experiência. Quando voltar, regressarei à direção de atores com o Tó Melo para
mais uma produção da Plural/TVI.
M.L: Qual é a coisa que gostava de fazer e não tenha
feito ainda?
I.L: A nível
profissional, vou entrar este ano exatamente com uma estreia no meu percurso: a
encenação. Como todas as estreias, também esta está a acarretar ansiedade (da
que é boa) e entusiasmo. E estou a começar a estruturar um espetáculo que quero
fazer em 2013, como atriz, e que sinto que pode ser muito especial. Esperemos
para ver!ML
Isto é a Iolanda inteira e do avesso. É difícil encontrar alguém tão jovem, naturalmente educada nos modos e na alma.
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