terça-feira, 17 de dezembro de 2013

Mário Lisboa entrevista... Artur Ribeiro

Olá. A próxima entrevista é com o realizador e escritor Artur Ribeiro. Desde muito cedo que se interessou pela realização e pela escrita, sendo um dos grandes talentos do panorama artístico português que surgiram nos últimos anos. Como realizador, estreou-se na realização de longas-metragens com "Duplo Exílio" (2001), uma longa-metragem sobre um homem (cujo os pais saíram dos Açores para emigrarem para os EUA, quando tinha 5 meses de idade) que regressa inesperadamente a Portugal, depois de ser, injustamente, acusado de um crime que não cometeu, e, ao longo do seu percurso como realizador, dirigiu várias produções cinematográficas e televisivas, e, como escritor, escreve para teatro, cinema e televisão. Recentemente, coescreveu o guião da longa-metragem de ficção científica "RPG" (Real Playing Game) de David Rebordão e do produtor Tino Navarro e com um elenco encabeçado por Rutger Hauer, e, atualmente, é autor da telenovela "Belmonte" que está em exibição na TVI, da qual é baseada num formato chileno, e conta com a participação de atores como a brasileira Graziela Schmitt, Filipe Duarte, Marco D'Almeida, João Catarré, Diogo Amaral, Lourenço Ortigão, Manuela Couto, Almeno Gonçalves, Joana Solnado, Carla Galvão, Paulo Pires, Sofia Grillo, José Wallenstein, Luísa Cruz, Sílvia Rizzo, João Didelet, Elsa Galvão, Rita Calçada Bastos, o britânico Norman MacCallum e Estrela Novais. Esta entrevista foi feita, por via email, no passado dia 1 de Maio.

M.L: Quando surgiu o interesse pela realização e pela escrita?
A.R: Desde a primeira vez em que fui ao cinema, em criança, que disse que era aquilo que eu queria fazer. Na altura, ainda não percebia o que era um argumentista ou um realizador e dizia que queria ser ator, mas quando fui adquirindo mais conhecimentos sobre como se faz cinema e televisão, rapidamente defini que o que queria ser ("quando fosse crescido") era realizador e argumentista.

M.L: Quais são as suas influências nestas duas áreas?
A.R: Recolho influências muito diversas: da literatura ao teatro e, claro, do cinema e da televisão. Mas posso, por exemplo, referir que, quando era adolescente, houve um período essencial que me marcou com duas influências aparentemente paradoxais, mas, para mim, equitativamente importantes: um ciclo de cinema do Ingmar Bergman que passou na televisão ao Domingo à noite, a que eu assisti religiosamente, ao mesmo tempo que no cinema vi fascinado "Os Salteadores da Arca Perdida" (1981) do (Steven) Spielberg. Penso que ambas as experiências marcaram, em mim, a ideia de que o cinema pode ser uma profunda análise ao mais íntimo e sombrio da alma humana e, ao mesmo tempo, uma fantasia heróica e aventureira. Na literatura, foi também marcante, nessa altura da minha vida, ler, por exemplo, Albert Camus e Jean-Paul Sartre ou, por exemplo, "A Montanha Mágica" do Thomas Mann (que lembro-me ter proporcionado dias inteiros de leitura compulsiva), ao mesmo tempo que lia ficção científica (sobretudo, o Philip K. Dick, Robert (A.) Heinlein, etc), e o que mais uma vez demonstrava a riqueza de mundos e ideias que a ficção nos oferecia.

M.L: Escreve para teatro, cinema e televisão. Qual destes géneros que mais gosta de escrever?
A.R: Todos, sem preferência. Tudo depende da ideia do projeto, da história que tenho para contar, e depois, claro, das condições para a concretizar.

M.L: Qual foi o trabalho que mais o marcou, tanto como realizador e como escritor?
A.R: Como argumentista, foi, sem dúvida, a minissérie "O Dom" (TVI), que ainda considero o melhor que escrevi para televisão. Como dramaturgo, foi o monólogo para teatro "Onde Estavas Quando Criei o Mundo?" que estreou no Teatro Nacional (D. Maria II) em 2012 e interpretado pela Manuela Couto. Em cinema, apesar do meu primeiro filme "Duplo Exílio" (2001) ter sido marcante por ser o primeiro, ainda estou à espera de escrever e realizar um filme que me faça sentir tão realizado como me senti nesse trabalho para televisão e para teatro.

M.L: Entre 2008 e 2009, realizou, juntamente com André Cerqueira e José Manuel Fernandes, a série “Equador” que foi exibida na TVI e baseada no livro, com o mesmo título, da autoria de Miguel Sousa Tavares. Que recordações guarda desse trabalho?
A.R: Foi uma experiência extraordinária pela dimensão do projeto, ao mesmo tempo que, como realizador, foi um privilégio trabalhar com um elenco extenso e fabuloso, assim como uma equipa criativa e dedicada, numa rodagem que, pelas próprias características (filmagens na Índia, no Brasil, para além de Portugal e São Tomé (e Príncipe), tornou-se inesquecível para todos os que nela participaram.

M.L: Como vê, atualmente, o teatro e a ficção nacional?
A.R: É impossível responder a esta pergunta sem falar, infelizmente, da crise, e é preocupante que em televisão (e imagino que no teatro também) os orçamentos sejam cada vez mais reduzidos e, por tal, para não se perder de todo o desenvolvimento da produção nacional, é talvez necessário encontrar novas formas de filmar em que se privilegie o investimento no talento, que começa na escrita e que é quase sempre o parente pobre de uma produção, mas sem um bom guião não se faz boa ficção. E se hoje se podem baixar os custos de produção técnicos por os equipamentos serem mais acessíveis (câmaras, pós-produção, etc, são mais acessíveis que há alguns anos atrás), não se deve reduzir o investimento nas pessoas com talento e na criação e no desenvolvimento de ideias. Infelizmente, no que toca à escrita do guião, o normal é muitas vezes as produções partirem com pouco tempo para o desenvolvimento das ideias, escrita e reescrita, e muitas vezes isso depois reflete-se no produto final.

M.L: Como é que é a sua rotina, quando escreve?
A.R: A minha rotina é tentar evitar uma rotina. Por isso, vario muito, tanto nas horas a que escrevo, como onde escrevo. Gosto de mudar de sítio, nem que seja trocar de mesa em casa, mas ando, às vezes, de café para café, e gosto até de mudar de país (escrevi a peça "Onde Estavas Quando Criei o Mundo?" em 4 semanas em Nova Iorque, os cafés são muito mais convidativos à escrita). Mas, normalmente, escrevo sempre algo de manhã, em casa, e depois saio, ou para o escritório da produtora em que estiver a trabalhar ou mesmo para a beira-mar (onde escrevo muito também) e, às vezes, fico pela noite dentro a escrever, mas, ultimamente, tenho tido mais inspiração de manhã e chego a acordar às 5 horas da manhã com uma ideia e levanto-me para ir escrever (não vale a pena ficar a dar voltas na cama a tentar voltar a dormir, quando a inspiração pede que se escreva). Por isso, seria incapaz de ter um horário de trabalho para escrita e uma rotina de escritório.

M.L: Ajuda na escolha do elenco de uma produção televisiva em que está envolvido (tanto como realizador e como guionista)?
A.R: Sim, sugiro e colaboro sempre. Sobretudo, porque na Plural (onde tenho trabalhado nos últimos anos) ter tido sempre essa abordagem, por parte dos diretores de projeto.

M.L: Em 2012, as telenovelas “Remédio Santo” da TVI e “Rosa Fogo” da SIC foram nomeadas para o Emmy Internacional na categoria de Telenovela. Como vê este reconhecimento internacional?
A.R: É ótimo, embora nos falte esse reconhecimento nas séries, mas para isso é preciso continuar a investir nesse formato.

M.L: Qual o conselho que daria a alguém que queira ingressar numa carreira seja na realização ou na escrita?
A.R: Que escreva e realize (nem que seja com um telemóvel), mas também leia muito, veja muito cinema e séries, e estude (quer numa escola, quer como auto-didata). 

M.L: Que balanço faz do percurso que tem feito, até agora, como realizador e como escritor?
A.R: Felizmente, apesar de, naturalmente, ter a ambição de fazer muito mais, posso dizer que, pelo menos, tenho conseguido trabalhar em projetos que gosto e em formatos variados com desafios diversos, mesmo com as limitações inerentes à produção nacional.

M.L: Qual é a coisa que gostava de fazer e não tenha feito ainda?
A.R: Produzir o meu próprio filme independente, escrito e realizado por mim, rodeado dos atores e equipa com quem mais gosto de trabalhar, e ver esse filme ter (e merecer) sucesso.

M.L: O que é que gostava que mudasse nesta altura da sua vida?
A.R: Gostava que me saísse o Euromilhões para poder produzir o tal filme da pergunta anterior... Mas, para isso, acho que tinha de jogar no Euromilhões, e nunca jogo...ML

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