domingo, 8 de dezembro de 2013

Mário Lisboa entrevista... Liliana Leite

Olá. A próxima entrevista é com a atriz Liliana Leite. Desde muito cedo que se interessou pela representação, e tem desenvolvido uma promissora carreira como atriz que passa pelo teatro, pelo cinema e pela televisão. Apaixonada pelo que faz, tem apostado fortemente na formação, e, recentemente, participou na curta-metragem "Um Dia..." de André Sousa, cujo o guião foi escrito por ambos, com a orientação do realizador e escritor Artur Ribeiro, e é a primeira curta-metragem produzida pela Zatara's, uma associação de produção artística e cultural, da qual fundou. Esta entrevista foi feita, por via email, no passado dia 26 de Agosto.

M.L: Quando surgiu o interesse pela representação?
L.L: Desde muito jovem que brincava com animais e lhes dava um nome, atribuía uma história, um local para viverem. Sempre preferi coisas que fossem diferentes do standard, experimentava brincadeiras de criança com raparigas, mas não queria perder a experiência das brincadeiras dos rapazes. Aos 6 anos experimentei o teatro e lembro-me de pensar que tinha medo de não fazer bem as marcações ou dizer a frase no momento certo. Hoje sei que o que senti foi adrenalina. Foi isso que me puxou para as artes, para o teatro, para a literatura, para o cinema. Fica-se viciado na sensação de adrenalina que o palco nos dá. Amam-se outras artes, quando nos provocam essa mesma sensação. Julgo que sempre senti interesse pela representação, mas, nem sempre, de forma consciente. Aos 22 anos, tive a certeza que só seria realmente realizada, se fosse atriz.

M.L: Quais são as suas influências, enquanto atriz?
L.L: Estranhamente, as minhas referências técnicas são de homens. Sou uma admiradora fervorosa do Denzel Washington e do Morgan Freeman. Admiro o trabalho da Angelina Jolie, pois está bem em tudo o que faz. Gostava muito de trabalhar com a Maria João Luís e com a Rita Blanco, são extraordinariamente inteligentes. Estes atores são referências, possivelmente influências, mas julgo que as maiores influências são ao nível da metodologia (Margie Haber, Michael Margotta, Stela Adler), pois permitem-me, enquanto atriz, encontrar auxílio técnico para lidar comigo, na descoberta da vida das personagens que é suposto viver.

M.L: Faz teatro, cinema e televisão. Qual destes géneros que mais gosta de fazer?
L.L: São muito díspares e desafiantes. Todos os atores têm de fazer teatro, devem fazer televisão e têm de ser merecedores do Cinema. O teatro ensina-nos muito, a televisão obriga-nos a sermos melhores e mais eficientes, e quero pertencer ao Cinema sempre que possível.

M.L: Qual foi o trabalho que mais a marcou até agora, enquanto atriz?
L.L: Não tenho um trabalho que destaque mais, tive agradáveis surpresas com coisas que nunca julguei fazer. Foi difícil e compensador fazer um documentário, onde vivi a Santa Beatriz da Silva, lembro-me de receber indicações do realizador: “Estás morta, e és uma santa, logo quero que os teus olhos fechados sorriam e nada de mexer a boca”. Gostei da minha Martírio de “A Casa de Bernarda Alba”, pelo impacto que causava no público, e a minha Sara de “Wisegirls”, pela liberdade de improvisação que tive (ainda não estreou).

M.L: Em 2012, fez uma breve participação na longa-metragem “Linhas de Wellington” de Valeria Sarmiento. Que recordações guarda da sua participação nessa produção?
L.L: A produção de “Linhas de Wellington” foi extraordinária. A equipa técnica e de atores eram excecionais, tive a felicidade e a sorte de poder privar com atores com quem aprendi muito. Foi uma experiência brutal, porque quando estava no plateau, efetivamente, estávamos em outro tempo, a viver outras vidas. A Isabel Branco é formidável, e isso está espelhado na Direção de Arte. Esteve sempre muito frio. Os dias eram muito longos, mas a partilha, as conversas, o poder aprender com pessoas tecnicamente muito boas, obriga-nos a evoluir. Espero que continuem a existir produções desta envergadura em Portugal.

M.L: Como vê, atualmente, o teatro e a ficção nacional?
L.L: Infelizmente não sou muito atenta à ficção em Portugal, mas percebi que o número de produções para TV aumentou substancialmente, o que me agrada, pois haverá menos atores desempregados. Consumo mais Teatro e fico feliz com o índice de criatividade que hoje existe no teatro. A crise obriga a que as pessoas se tornem, naturalmente, mais criativas e isso agrada-me. Lamento que os financiamentos públicos continuem a ser sempre para “alguns”, pois existem companhias que têem feito trabalhos excecionais sem quaisquer apoios. Vejo algumas mudanças, e a mudança agrada-me.

M.L: Gostava de fazer uma carreira internacional?
L.L: Trabalho para isso.

M.L: Recentemente, participou numa masterclass dada pela atriz americana Melissa Leo, da qual foi integrada na edição deste ano do Fest-Festival Internacional de Cinema Jovem em Espinho. Na sua opinião, a formação é importante para o desenvolvimento do ator?
L.L: Sou frequentadora assídua do Fest, é um excelente festival para quem gosta de cinema. O que aconteceu, foi que tinha uma entrevista agendada com a Melissa Leo, no âmbito da minha tese de Mestrado. Naturalmente, assisti a masterclass da Melissa, que me auxiliou em grande escala. A formação é essencial em qualquer área. Mas para se poder formar é essencial ser generoso e saber-se o que se está a fazer. A Melissa tem 30 anos de carreira e mostrou-me uma perspetiva de estudo nova, clara e útil.

M.L: Que balanço faz do percurso que tem feito até agora como atriz?
L.L: Tem sido uma aprendizagem e uma evolução constante. O que considero que correu pior foi o facto de ser uma apaixonada pelo que faço e não aceitar que tudo é um negócio e que deveria ser uma indústria. É um mal de muitos atores/artistas, que permite que o nosso sistema abuse de nós. Não é aceitável termos uma profissão não reconhecida e sem estatuto profissional. Não é aceitável ser artista de teatro, bailado, cinema, rádio e televisão e não ATRIZ. Se tivesse menos obrigações fiscais e alguns direitos, seria um balanço mais positivo. Ainda assim, este trabalho faz-me feliz.ML

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