segunda-feira, 14 de agosto de 2017

Mário Lisboa entrevista... Paulo Portugal

Interessou-se pelo jornalismo quando ainda estava a estudar Direito, embora já tinha começado a trabalhar, e tem desenvolvido um longo percurso nessa área que passa nomeadamente pelo cinema, tendo já entrevistado múltiplas personalidades do meio cinematográfico. Jornalista freelancer, é atualmente o responsável pelo site "Insider" que é essencialmente dedicado ao cinema, e gostava de escrever um livro e até um documentário. Esta entrevista foi feita no passado dia 8 de Agosto.

M.L: Quando surgiu o interesse pelo jornalismo?
P.P: Surgiu quando ainda estava a estudar Direito, mas já tinha começado a trabalhar. Por sinal, numa breve experiência na Atalanta Filmes, de Paulo Branco, em 1991. Nessa altura comecei a escrever no jornal da universidade e em jornais locais. Entretanto, ofereceram-me um trabalho fixo na revista TV Guia, onde acabei por ficar alguns anos. Apesar de não ver televisão, acabou por ser uma boa experiência. Paralelamente, sempre colaborei com outros jornais: Jornal de Letras, A Capital, Premiere, Máxima, GQ, etc.

José Vieira Mendes (Ex-Diretor da "Premiere") & Paulo Portugal
M.L: Quais são as suas referências nessa área?
P.P: De jornalismo de cinema? Cresci a ler a secção de cinema do Jornal Sete, entre os anos 80 e 90, bem como a seguir a crítica de cinema que se fazia no Expresso. Entretanto também o Público e o que se ir fazendo lá por fora.

M.L: Como jornalista, tem-se dedicado essencialmente ao meio audiovisual nomeadamente o Cinema. O Cinema, a seu ver, ainda tem aquela magia que, por exemplo, a televisão e os videojogos podem não ter o suficiente?
P.P: Terá, apesar do lado industrial, acabar por se distanciar bastante daquilo que eu considero cinema. Embora isso não seja necessariamente uma atividade intelectual reservada a entendidos. Refiro-me apenas a um cinema que nos espevite e seduza, mas não necessariamente pela qualidade dos efeitos especiais... Os videojogos sempre me seduziram, sobretudo pela qualidade narrativa de alguns e a sua capacidade de se aproximarem ao cinema. No entanto, confesso, regresso sempre à minha base que é o cinema.  

M.L: Ainda no que toca ao Cinema, houve alguma entrevista em particular que, para si, tenha sido tanto marcante como difícil de fazer?
P.P: Ir de Lisboa ao Porto de propósito para entrevistar o Manoel de Oliveira na sua casa, por ocasião dos seus 99 anos, foi um momento. Mas recordo sempre quando entrevistei pela primeira vez o George Clooney, em Deauville, em 1998, por “Romance Perigoso”, do (Steven) Soderbergh, em que nos sentamos numa mesinha a falar descontraidamente. Porque ele é mesmo assim. Já entrevistei muitos realizadores míticos e estrelas de cinema e cada um me marcou de certa forma. A última entrevista que fiz foi à Nastassja Kinski no Festival de Locarno. Acho até que foi uma das que mais me surpreendeu.

Nastassja Kinski & Paulo Portugal
M.L: Fundou e dirigiu a extinta revista de cinema e audiovisual, “Showbiz”, entre 2004/06. Que recordações guarda dessa experiência?
P.P: Foi uma experiência. Como foi a Voice, uma revista quinzenal de música e cinema e como foram as Primeiras Imagens, uma revista mensal concorrente da Premiere. A Showbiz pretendia ser uma publicação de muito baixo custo, praticamente gratuita que lancei graças ao apoio de um pequeno editor. Mas sem o apoio de distribuição tornou-se difícil chegar ao nosso mercado. Por isso, morreu cedo demais.

M.L: É também o responsável pelo “Insider” que é um site essencialmente dedicado ao cinema (http://www.insider.pt/). Como é que surgiu a ideia para criar o “Insider” e também como olha para o percurso que este projeto tem desenvolvido até agora?
P.P: O Insider faz parte daquela teimosia em criar um órgão de comunicação dedicado ao cinema. Sobretudo numa altura em que o jornalismo em papel sofre uma crise profunda com consequências para a minha atividade de jornalista freelancer nessa área. Como habitualmente tenho muito conteúdo, devido aos muitos festivais que frequento, e poucos meios para escoar esse material, entendi que seria oportuno aprender mais sobre o jornalismo online e fazer algo novo. No entanto, o que existe no Insider está ainda muito longe daquilo que realmente quero fazer nessa área. 

M.L: Em Portugal, programas dedicados ao cinema como “Janela Indiscreta” (RTP1) e “Cinemax Curtas” (RTP2) e tenho tido há já bastante tempo a impressão de que a nossa Comunicação Social dá mais destaque a filmes e acontecimentos cinematográficos que têm mais visibilidade. O Cinema devia ter uma representação mais abrangente na Comunicação Social em termos de formação de públicos?
P.P: A resposta é óbvia, não é? Acho mesmo que se deveria ir mais longe e integrar no ensino básico uma componente de formação do olhar para a coisa artística, não só do cinema, mas de todas as artes. No fundo, ensinar as crianças a olhar para a arte e sabê-la interpretar. Tenho a certeza de que, com o tempo, isso traria um público bem mais interessado. Alguma (a grande parte) comunicação social generalista segue apenas a lógica do mercado e destaca aquilo que é mais abrangente, embora no caso do Curtas exista um esforço louvável de dignificar a curta-metragem e até de dar a conhecer alguns nomes.

M.L: Qual conselho que daria a alguém que queira ingressar numa carreira na área do jornalismo?
P.P: Talvez pensar duas vezes. Ou três. Isto porque o jornalismo atravessa um período de crise que tem a ver com a transição do papel para o online, mas também a forma como grande parte dos jornalistas são moldados. Acabam o seu curso e começam a carreira de estagiários, e é esse exército de estagiários que alimenta hoje em dia as redações acabando mais facilmente por espelhar uma lógica mainstream. Talvez o melhor conselho é mesmo procurar estar familiarizado com os mais diversos tipos de jornalismo, e as ferramentas disponíveis, embora sem nunca descurar o nosso lado mais subjetivo.

M.L: Que balanço faz do percurso que tem desenvolvido até agora como jornalista?
P.P: Tem sido um percurso de luta constante. Sobretudo desde que sou freelancer, mas também onde tenho tido as minhas melhores experiências. No entanto, desde há alguns anos para cá, a crise no setor tem sido sempre em sinal contrário. É essa minha teimosia em querer fazer algo de novo que me aguenta. Isso e o envolvimento com o cinema. 

M.L: Qual é a coisa que gostava de fazer e não tenha feito ainda nesta altura da sua vida?
P.P: Possivelmente, gerir o meu órgão de comunicação de uma forma mais continuada, e com os meios que permitam renovar-se e crescer. Penso também em escrever um livro e até um documentário. Se calhar, com o tempo lá chegaremos.ML

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