quarta-feira, 30 de setembro de 2015

Brevemente...

Entrevista com... Elizabeth Bochmann (Atriz)

Mário Lisboa entrevista... Carla Chambel

Estreou-se na representação em 1995 com a peça "A Disputa" de Marivaux e encenada por João
Perry no Teatro da Trindade e foi o mote para um notável percurso como atriz que já conta com 20 anos de existência e passa pelo teatro, pelo cinema e pela televisão (onde entrou em produções como "A Febre do Ouro Negro" (RTP), "Lusitana Paixão" (RTP), "Inspetor Max" (TVI), "A Ferreirinha" (RTP), "Até Amanhã, Camaradas" (SIC), "João Semana" (RTP), "Jura" (SIC), "Vingança" (SIC), "Resistirei" (SIC), "Bem-vindos a Beirais" (RTP), "Poderosas" (SIC). Uma das atrizes mais dotadas da sua geração, desde Dezembro de 2014 que é Vice-Presidente da Academia Portuguesa de Cinema, e co-protagoniza a peça "Breviário para um Extermínio Silencioso" de Mike Bartlett e encenada por Rui Neto, na qual vai estrear no Clube Estefânia em Lisboa no próximo dia 22 de Outubro. Esta entrevista foi feita no passado dia 20 de Setembro.

M.L: Quando surgiu o interesse pela representação?
C.C: Bom, desde pequena fui estimulada pela escola e em casa a criar um gosto pela leitura em voz alta, de poesia, prosas, a cantar. Mais tarde, já no secundário, ao ver um espetáculo do Teatro Meridional (“Ki Fatxiamu Noi Kui”, 1992) fiquei deslumbrada com aquela linguagem e, em conjunto com outros colegas, fundámos o nosso primeiro grupo de teatro. Foi então que descobri o conservatório de teatro, a dita Escola Superior de Teatro e Cinema de Lisboa, e percebi que me podia formar como atriz, aprender com mestres e tirar um curso. Também foi quando comecei a ir ver teatro a todo o lado que podia: Comuna, Bando, Meridional, Cornucópia… Foi muito importante, naquela época, ver como se fazia.

M.L: Quais são as suas referências, enquanto atriz?
C.C: Houve professores que me marcaram profundamente: António Feio, João Mota, Maria João Serrão, Luca Aprea. Mais tarde, como profissional fui aprendendo com outros colegas e há pessoas que admiro muito pela forma como trabalham, como se entregam: Miguel Seabra, Luísa Cruz, Ivo Canelas, Carla Galvão. E em todos os trabalhos vou encontrando colegas com os quais tenho pontos de afinidade e aprendizagem que também se tornam referências para mim. A Lúcia Moniz foi um destes últimos casos.

M.L: Qual foi o trabalho que mais a marcou, até agora, durante o seu percurso como atriz?
C.C: É difícil escolher. Cada trabalho é como um muro que eu tenho que estudar a melhor estratégia de como o vou escalar até conseguir chegar ao topo e transpô-lo para o outro lado. E do outro lado há tantas coisas novas para ver! São essas coisas que muitas vezes nos surpreendem durante o trabalho e que torna tudo muito mais desafiante e gratificante.

No teatro posso dizer que a “Ditosa” da “História do Gato e da Gaivota que a Ensinou a Voar”, do Teatro Meridional, foi um desses muros que deu muito gozo transpor e de certo modo voar a partir dele. E, claro que fazer uma “Julieta” de (William) Shakespeare é um sonho concretizado.

No cinema foi muito desafiante fazer a subcomissária de polícia no filme “Quarta Divisão” (2013) de Joaquim Leitão. Uma personagem muito distante de mim, que exigiu um empenho a nível físico, de destreza e atitude emocional que não pratico todos os dias.

Por último na televisão é indiscutível que a “Marina” de “Bem-vindos a Beirais” (RTP) me marcará por muito tempo, não só pelo sucesso do projeto como pelo espírito de família que se criou ao longo de dois anos e tal de gravações.

M.L: Entre 2007/08, participou na telenovela “Resistirei” que foi exibida na SIC, na qual interpretou a personagem Júlia Mascarenhas. Que recordações guarda desse trabalho?
C.C: Ironicamente o trabalho fez jus ao nome da novela. Foi um trabalho de resistência, onde o muito empenho da equipa e da produção foi posto de parte pela então nova direção da SIC. Gravámos o projeto até ao fim mesmo depois da novela sair do ar. Ainda assim guardo excelentes memórias, nomeadamente o trabalho com grandes atores como o Rui Luís Brás, o Nuno Melo, a Carla Maciel… e uma equipa incansável.

M.L: Como vê, atualmente, o teatro e a ficção nacional?
C.C: Vejo o teatro sob grandes mudanças, e no meu ponto de vista para melhor. Mas falo da vontade dos artistas em fazê-lo, não da parte de quem nos governa. Fiquei muito feliz com a iniciativa recente do Teatro Nacional D. Maria II, dirigido atualmente pelo Tiago Rodrigues, de abrir gratuitamente as portas ao público durante três dias e criar uma avalanche de filas que só mostra que as pessoas querem ir ao teatro! Essa dinâmica de proximidade é cada vez mais importante desenvolver, desmistificar o erudito da cultura. Ela é e deve ser para todos e acessível a todos!

A ficção encontra-se numa fase em que a tecnologia já permite uma produção mais simplificada e barata dos conteúdos. Ainda assim sinto que há um grande investimento nos produtos para grandes massas e investimento insuficiente para conteúdos mais alternativos. A Academia RTP está a fazer um trabalho interessante a esse nível, assim como os festivais de curtas-metragens que vão ocupando cada vez mais as programações dos cineteatros a nível nacional, dando a conhecer as jovens promessas.

M.L: Em 2015, celebra 20 anos de carreira, desde que se estreou como atriz com a peça “A Disputa” de Marivaux e encenada por João Perry no Teatro da Trindade em 1995. Que balanço faz destes 20 anos?
C.C: São 20 anos de constante aprendizagem. Gosto de trabalhar com as pessoas e por isso, retiro sempre uma aprendizagem do trabalho com elas. Isto serve para as boas experiências mas também para as menos boas. Tem sido um percurso feito de muito trabalho, muito empenho, alguns “nãos” como resposta, e felizmente muitos “sins” que me têm permitido mostrar várias valências. Gosto de saltar de companhia em companhia, não ficar no mesmo canal por muito tempo, conhecer diferentes realizadores. Isso tem tornado a minha experiência enquanto atriz muito mais rica. Tenho medo de estagnar. Julgo que a sorte também me tem acompanhado e tem colocado no meu caminho excelentes desafios que me obrigam a superar-me.

M.L: Como lida com o público que acompanha sua carreira há vários anos?
C.C: É sempre agradável quando alguém nos aborda e manifesta o seu apreço pelo nosso trabalho. Seja presencial ou virtualmente. Hoje em dia o Facebook também é um veículo para essas mensagens às quais tento responder sempre que posso. Também atento às críticas que fazem ao meu trabalho. É importante termos um ponto de vista do espetador. Perceber se o tocámos ou não e quais as razões. A verdade é que o meu trabalho é feito para eles e por isso é muito importante para mim que chegue até eles.

M.L: Recentemente, participou na série “Bem-vindos a Beirais” que está em exibição na RTP. Já alguma vez imaginou que a série tivesse o sucesso que tem tido até agora?
C.C: Não, claro que não. Há muito que a RTP estava longe de ter sucessos em ficção e muito menos em horário nobre. Foi um projeto de três meses que se transformou numa bonita viagem de mais dois anos. Houve um espírito de família que se manteve ao longo de todo o projeto. Criou-se uma família beiralense. Cada um de nós ganhou mais uma terra para além daquela em que nasceu e isso vai marcar-nos para sempre. E claro que o público foi fundamental neste processo. Ele escolheu-nos para passar a fazer parte do serão e isso orgulha-nos muito.

M.L: Desde Dezembro de 2014 que é Vice-Presidente da Academia Portuguesa de Cinema. Como vê o percurso que a Academia tem desenvolvido, desde a sua fundação em 2011 até agora?
C.C: Vejo uma vontade sincera de procura na promoção do cinema português e dos seus intervenientes. Os Prémios Sophia são a cara mais visível da Academia e sei que dão muito, mesmo muito trabalho para conseguir pô-los de pé ano após ano. O trabalho é feito a partir da disponibilidade dos elementos da direção e de uma equipa muito reduzida de produção que trabalha ao longo do ano com a Academia. Mas a Academia está a alargar a sua atuação. No ano passado já tivemos, por exemplo, os Prémios Sophia Estudante, que visam premiar o que de melhor se faz nas escolas de cinema de todo o país, apostando claramente na formação como base de aprendizagem da 7ª arte. Um dos trabalhos da Academia também tem passado por fazer e melhorar a sua comunicação, cativar novos associados, procurar mais parcerias. Desenvolve várias responsabilidades, como as de indicar os candidatos aos Óscares, ou aos Prémios Goya. Neste momento está a trabalhar, em conjunto com o ICA, na preparação do Ano do Cinema. E muito mais haveria a dizer. Há uma vontade séria e honesta em fazer melhor pelo nosso cinema. E foi isso que me cativou a entrar para a Academia e oferecer o meu modesto contributo.

M.L: Em 2011, Portugal conquistou o seu segundo Emmy com a telenovela da SIC “Laços de Sangue”, na qual trabalhou como diretora de atores. Como é que se sentiu ao saber que “Laços de Sangue” ganhou o prémio?
C.C: Muito orgulhosa, naturalmente. Foi a minha primeira e única experiência em direção de atores num projeto de ficção e senti que foi uma oportunidade única para conhecer como funciona a máquina para lá das câmaras. É completamente diferente. Ficamos com uma noção maior de como funcionam os vários setores, como se interligam. Também me permitiu conhecer a precariedade em que trabalham os técnicos. 12 horas por dia, 5 dias por semana, são 60 horas semanais. Ganharam ainda mais a minha admiração depois de ter passado por aquela experiência e por me ter sentido como um deles. Claro que depois há louros como os Emmys que são gratificantes receber, mas na verdade, no dia-a-dia, a trabalhar no duro, não significam muito.

M.L: Qual conselho que daria a alguém que queira ingressar numa carreira na representação?
C.C: Antes da carreira que procure a formação. Ser ator é uma arte que deve ser cuidada e respeitada como qualquer outra profissão. É uma vida inconstante que se abraça, em que somos constantemente postos em causa. E há uma aprendizagem a fazer ao recebermos um “não” como resposta. Nós somos o nosso instrumento, o objeto da avaliação e por isso há que desenvolver uma estrutura forte que saiba filtrar o que é uma crítica ao nosso trabalho do que nós somos. Daí ser tão complicado quando se trata de crianças ou adolescentes. Eles estão em processo de construção do “eu” e ser demasiado elogiado ou preterido irá afetar a sua auto-estima. Apesar de todo o deslumbramento que esta profissão possa ter, tem momentos muito duros e que nos obrigam a fazer escolhas que nem sempre queremos. Depois há momentos que compensam tudo isto: o “sim” daquele casting tão difícil, aquele ensaio em que sentimos que “chegámos lá”, o aplauso do público, o recorde de audiência, uma crítica de reconhecimento.

M.L: Quais são os seus próximos projetos?
C.C: Neste momento estou em ensaios para um espetáculo na Escola de Mulheres. “Breviário para um Extermínio Silencioso” é uma peça a partir do original “Contractions” de Mike Bartlett. A encenação está a cargo do Rui Neto e estarei em cena com a minha querida colega e amiga Isabel Medina. Irá estrear a 22 de outubro no Clube Estefânia, em Lisboa. Ficará em cena até meados de Novembro. Logo de seguida iniciarei um novo projeto também em teatro que estreará em Março, mas deste ainda guardo segredo porque está em fase de preparação. Por isso é um regresso ao teatro muito desejado ao fim de dois anos de televisão.

M.L: Qual é a coisa que gostava de fazer e não tenha feito ainda nesta altura da sua vida?
C.C: Tantas coisas. Quando tinha 15 anos e julgava que queria ser veterinária, o teatro atravessou-se na minha vida de forma tão intensa que decidi mudar o meu rumo. E isso passou a ser um mote na minha vida. Não tenho nada como adquirido. Tudo pode mudar de um momento para o outro. Tenho projetos dentro e fora da Arte que gostava de concretizar. Começo a ter um bicho aqui dentro que me diz para encenar, mas ainda não tive a coragem para me lançar. Tenho ideias para um filme e para uma série. Seria um sonho concretizá-los.ML

Fotografia: Cinéfilos.tv/Luís Silveira e Castro 

segunda-feira, 21 de setembro de 2015

Brevemente...

Entrevista com... Carla Chambel (Atriz)

Fotografia: Cinéfilos.tv/Luís Silveira e Castro

Mário Lisboa entrevista... Carlos Neves

O interesse pelo audiovisual surgiu quando frequentou um curso de operadores de vídeo no Centro de Formação da RTP e desde aí tem desenvolvido um percurso nessa área que já conta com 3 décadas de existência e muita experiência em géneros tão diferentes. Realizador e operador de câmara, trabalhou, por exemplo, na produtora Plural Entertainment Portugal (ex-NBP) entre 1994 e 2010, e profissionalmente gostava de fazer muito mais e melhor e ainda voltar a realizar. Esta entrevista foi feita no passado dia 28 de Agosto.

M.L: Quando surgiu o interesse pelo audiovisual?
C.N: Enquanto fazia o 12º ano de escolaridade na Escola d’Artes Decorativas António Arroio tive a oportunidade de frequentar em simultâneo um curso de operadores de vídeo no Centro de Formação da RTP. Aí foi “amor à primeira vista”, apaixonei-me pelo trabalho de câmara e nunca mais deixei de fazer televisão.

M.L: Quais são as suas influências nesta área?
C.N: A minha primeira influência foi o realizador Herlander Peyroteo com quem tive o privilégio de aprender, primeiro no CF e depois na produtora TV5 Megahertz onde fiz a minha primeira série televisiva “Cobardias” (RTP). Depois mais tarde na produtora Edipim, conheci o meu outro mentor, o realizador Nuno Teixeira. Estes dois senhores tão diferentes no estilo (clássico/moderno) e na atitude, ensinaram-me as bases do que era trabalhar em televisão tanto na forma como no conteúdo e desde a maneira de estar ao rigor com que lidavam com todo o processo foram sem dúvida as minhas maiores referências. Tinham em comum o gosto pela ficção.

M.L: No audiovisual, tem trabalhado em géneros tão diferentes. De todos os géneros que tem trabalhado até agora, qual é o que prefere mais?
C.N: Sem dúvida alguma, a ficção.

M.L: Ao longo das últimas 3 décadas tem desempenhado tanto as funções de operador de câmara como de realizador. Em qual destas atividades em que se sente melhor?
C.N: Assumir as funções de realizador é sem dúvida o mais gratificante, no entanto confesso que por vezes me é difícil dissociar isso da operação de câmara.

Trabalhar em equipa com atores e técnicos é fantástico, poder moldar os diferentes componentes quer artísticos quer técnicos de forma a poder narrar a história conforme a visualizámos é o gozo supremo.

M.L: Qual foi o trabalho que mais o marcou, até agora, durante o seu percurso profissional?
C.N: Provavelmente “A Jóia de África” (TVI), tanto a nível pessoal como profissional.

M.L: Foi co-realizador da telenovela “Tempo de Viver” que foi exibida na TVI entre 2006/07. De que forma este projeto foi gratificante para si a nível de reconstituição histórica (11/9/2001)?
C.N: Foi um desafio lançado pelo coordenador do projeto e o autor do guião, o grau de dificuldade na execução do que estava escrito ao nível da reconstituição histórica e do contexto da história foi de facto um aliciante extra, apesar de achar que não se coaduna com o contexto da produção de telenovela, não é justo hipotecar num primeiro episódio o orçamento de um projeto inteiro. O resultado foi impactante mas efémero do ponto de vista da narrativa… Outro exemplo disso foi a novela “Olhos nos Olhos” (TVI), tempestades com ventos ciclónicos, acidentes de automóvel, derrocada de edifício, etc… tudo no 1º episódio.

Vale a pena também fazer referência a um outro projeto que do ponto de vista da reconstituição histórica teve tanto ou mais impacto e que creio ter sido bem mais equilibrado. As cenas do primeiro episódio da telenovela “Dei-te Quase Tudo” (TVI) relativo ao 25 de Abril de 1974.

M.L: Como vê, atualmente, o audiovisual, a nível global?
C.N: Com bastante apreensão, salvo honrosas exceções, é gerido por pessoas que pouco ou nada têm conhecimento do que consta realmente em todo o processo produtivo, como tal e por ignorância, não reconhecem nem sabem identificar a importância nem a especificidade dos diferentes “papéis” que cada um deve representar nesse processo, em resultado disso vulgarizam-se as funções, desrespeitam-se os mais experientes e cometem-se erros banais de forma consistente.

No final vêm-nos dizer que não há dinheiro e que a culpa é da crise! Quando na realidade nunca como agora dispusemos de tantas ferramentas para agilizar o processo, ou de técnicos e atores que fruto do percurso que fizeram, acumularam uma experiência e conhecimento que é menosprezado apenas por ser inconveniente.

Os restantes (que gerem e tomam decisões) são condicionados pelo mercado e acabam a alinhar pelo mesmo diapasão, apesar de aqui ou ali se lhes vislumbrar o sonho de um dia fazer as coisas de forma diferente.

M.L: Entre 1994 e 2010, trabalhou na produtora Plural Entertainment Portugal (ex-NBP). Como vê o percurso que a produtora tem desenvolvido, desde a sua fundação até agora?
C.N: Foi na sua origem fundamental para o despertar de forma consistente, do que agora se chama de Ficção Nacional, reuniu os profissionais que na altura apostaram nesse sonho de fazer ficção contra a corrente que dizia que não era rentável e apostava maioritariamente no entretenimento.
  
O tempo veio mostrar que o sonho era possível, depois de termos conquistado primeiro na RTP e depois na TVI a liderança nas audiências com conteúdos produzidos pela NBP veio o natural reconhecimento e apetência pela empresa. Surgiu então o vínculo à Media Capital e perdeu-se a independência de produzir conteúdos para os diferentes canais e eventualmente a aposta (que quanto a mim seria um sonho tornado realidade) de produzir independentemente (nessa altura produzíamos séries para a RTP1 e SIC e telenovelas para a TVI e RTP1) e através da NBP Internacional os nossos conteúdos tinham já um mercado interessante. O crescimento massivo da produção de telenovelas em detrimento de outros formatos na minha opinião foi um passo atrás naquilo que tinha sido até então a evolução da empresa. Mais tarde com a saída do António Parente da gestão da empresa houve um sentimento misto de que se poderia inverter o rumo das coisas pela necessidade de renovar ou que tudo se iria desmoronar por falta de liderança e objetivos firmes. O que veio a suceder depois aliado à conjuntura económica veio condicionar a produção e até agora pouco ou nada de novo nos trouxe.

M.L: Qual conselho que daria a alguém que queira ingressar numa carreira na área do audiovisual?
C.N: Que diversifiquem a sua área de conhecimentos e contactos, o nosso mercado é mínimo e muito fechado. O protecionismo praticado por diferentes grupos numa lógica de sobrevivência não ajuda à evolução/progressão, poucos são os que conseguem singrar por mérito sem ter de passar por se sentirem inconvenientes.

M.L: Que balanço faz do percurso profissional que tem desenvolvido até agora?
C.N: Sinto-me realizado e orgulhoso com o percurso que fiz até agora, mas faço tensões de fazer muito mais e melhor…

M.L: Quais são os seus próximos projetos?
C.N: Continuar todos os dias a batalhar por novos desafios e a aventurar-me por terrenos desconhecidos… Sempre com o olho em eventuais mudanças/oportunidades na área da produção de conteúdos, em particular na ficção nacional.

M.L: Qual é a coisa que gostava de fazer e não tenha feito ainda nesta altura da sua vida?
C.N: Voltar a Realizar.ML

segunda-feira, 14 de setembro de 2015

domingo, 13 de setembro de 2015

Mário Lisboa entrevista... Margarida Rodrigues

Iniciou-se na Fotografia em 2012 e desde aí tem desenvolvido um percurso como fotógrafa que promete chegar a grandes voos. Além da Fotografia, também tem experiência na psicologia e na ilustração, e recentemente lançou o livro “With the Absolute Heart of the Poem of Life” que é um projecto de fotografia sobre a Geração Beat que surgiu nos finais dos anos 50/inícios dos anos 60. Esta entrevista foi feita no passado dia 17 de Agosto.

M.L: Quando surgiu o interesse pela Fotografia?
M.R: Em 2012.

M.L: Quais são as suas influências nesta área?
M.R: Cinema; o meu objectivo de futuro. A minha mãe. E eu.

M.L: Desde 2012 que trabalha como fotógrafa. Como é que é a sua rotina em termos de preparação para um trabalho fotográfico?
M.R: Difícil e desafiante. Sou produtora de todos os meus trabalhos, o que torna o trabalho simultaneamente mais orgânico e genuíno. Control freak por excelência, penso que só poderia ser assim uma vez que cada fotografia que elaboro contém uma linguagem um pouco hermética. É um puzzle pessoal bastante simbólico que monto e que estou preparada rapidamente para desconstruir ao convidar pessoas para o executar, cuja energia é fundamental para que o produto final aconteça.

M.L: Além da Fotografia, também tem experiência na psicologia e na ilustração. Em qual destas actividades em que se sente melhor?
M.R: Melhor? Em todas. Provavelmente estarei muito bem também noutras tantas. Tenho a certeza que a minha vida é infinitamente insuficiente para tudo o que tenho capacidade para fazer; mas foi algo que aprendi a aceitar e confirmar ou desmentir até um dia morrer. Por agora, aprendo a ler marés e correntes e fazer não só o que gosto mas o que entendo que é necessário.

Fiz um mestrado em psicologia educacional; na realidade penso que já nasci psicóloga como todos nós. Todos temos a capacidade de curar o próximo se o quisermos fazer. Fui psicóloga fora da lei (portanto sem estágio para a ordem dos psicólogos) e orgulho-me de todo o meu trabalho durante esses três anos. E continuaria a fazê-lo caso houvesse oportunidade. Com um cenário de psicólogos a visitar escolas em modo de veterinários de aldeia, com famílias na corda bamba como manda a tradição e idosos a viverem no profundo isolamento, penso que seria necessária. Eu e tantos que neste momento não o estão a fazer.

Tudo surge da necessidade. Comecei a ilustrar pela necessidade de fazer frente à visão extremamente simplista que encontro frequentemente na ilustração infanto-juvenil. Ganham muitos prémios, elaboram “objectos” muito bonitos, mas ao observar narrativas do género “era uma vez um sapo” e temos uma ilustração na página oposta, fabulosa, minimalista de um sapo, acho que mais um neurónio na cabeça de uma criança morreu. Penso que esse mesmo neurónio morreu devido à corrente pedagógica made in Piaget que defende que não devemos ou não podemos fazer mais do que nos compete. Ora, durante a Universidade descobri a perspectiva de (Lev) Vygotsky que resumidamente defende que se quiser dançar antes de andar, nada o deve deter nem mesmo a própria incapacidade. As minhas ilustrações são sempre acompanhadas de narrativas também criadas por mim, normalmente recebidas com uma torcida de nariz pela maior parte das pessoas. Eu compreendo que as editoras tenham medo de gastar muito dinheiro em impressões megalómanas, que não tenha nome de mercado e que os pais queiram proteger as crianças de determinados conteúdos crus e frontais como as minhas histórias. Crus e frontais como os pais não querem que as crianças sejam.

A fotografia surgiu não só do meu pânico face a uma crescente visualização de uma versão cartoonesca do corpo humano (que nada tem a ver com perfeição), mas também como um desafio colocado a mim mesma. Abandonei no 11º ano a escola de artes que frequentava. Achei de forma lúcida que tudo já tinha sido inventado e que o máximo que poderia fazer seria boa qualidade de reciclagem, e que por isso deveria escolher uma profissão útil. Hoje, passados uns bons anos, depois de nunca ter deixado de criar, decidi de forma teimosa mentir a mim mesma e sem formação criar imagens. Fotografia requer mais qualquer coisa de fluido que eu não tenho, nem quero ter. Crio imagens para passar uma mensagem, mais do que criar algo bonito. Na tentativa de evitar a desvalorização geral de tudo, da banalização geral de tudo, de provocar um olhar atento não tanto por aquilo que o meu trabalho exibe, mas pelo que esconde.

Numa sinopse simpática, curta e grossa: sinto-me melhor onde me sinto necessária, e onde a minha capacidade pode responder a essa necessidade. É a coisa simples da minha vida ser tanto mais missão do que procura do prazer ou fuga à dor. Estou cansada de repetições, gostava que outros também o estivessem.

M.L: Como vê, actualmente, a Fotografia, a nível global?
M.R: Vejo como tudo. Com a fé imensa de ser surpreendida no meio do déjà vu que envia um suicida para destino previsível. É um peso enorme que se carrega quando toda a gente só procura leveza. Isto aplica-se à fotografia. Mas a teimosia puxa-me para o amanhã.

M.L: Recentemente, lançou o livro “With the Absolute Heart of the Poem of Life” que é um projecto de fotografia sobre a Geração Beat que surgiu nos finais dos anos 50/inícios dos anos 60. Como é que surgiu a ideia de criar este projecto?
M.R: Cada vez que me fazem essa questão, escolho sempre um caminho diferente. Tenho 3 linhas de aterragem. A primeira resposta é: pela memória. Trabalhei com adolescentes durante os últimos anos que achavam a Lady Gaga a coisa mais avant-garde do “pedaço”. Quando se dá explicações de História, uma disciplina extremamente mal tratada e sentida como uma mancha de bolor ou uma bola de naftalina, o desafio é sempre a dobrar: o de tentar fazer entender que o presente depende do que queremos ocultar lá atrás por falta de interesse da plateia. Neste contexto, certo dia numa aula, um miúdo disse “os hippies é que eram hardcore”. E pensei nos notáveis renascentistas que brilham à frente de gerações de cientistas e artistas geniais envoltos em trevas nos séculos anteriores que os empurraram até ao século XV. E pensei na Beat Generation que numa América branca desafiaram e desconstruíram o sonho americano através do seu talento ou ausência dele em viver e criar. Ao seu lado, a geração de 60 foi apenas uma consequência directa, uma explosão de marketing. Este tema é-me querido; a importância da memória, a importância de testemunhas, para que a única coisa que aprendemos com a História não seja que aprendemos nada com ela.

A segunda razão foi mais recente. Em 2012 comecei a ter pesadelos com algo que se tinha passado em 2004. Uma tentativa de violação sofrida enquanto estudante de intercâmbio nos EUA. Escapei com uma joelhada e decidi fazer o caminho de volta a pé até casa da minha família adoptiva. Mas era longe, e perdida durante umas 3 horas, parei após uma longa caminhada num alfarrabista que de forma certeira achou que “tinha olhos de peixe” e que precisava de algum conforto em livros. E por isso, ofereceu-mos. E sim, eram do Jack (Kerouac), Allen (Ginsberg) e (William S.) Burroughs. E outros sobre astrologia, um interesse que descobrimos ter em comum. Voltei para casa a pé onde me esperava o gato zarolho da família. Ao pé dele fiquei o resto do dia a ler as ofertas do velho sulista. Foram o meu conforto a milhares de km de casa e por isso estou-lhes eternamente grata. O que nos leva à terceira e última razão - a do agradecimento. Podemos sempre parar esta roda de energia que nos alimenta o ego e nunca retribuirmos, mas prefiro agradecer sempre, mesmo ao desconhecido, morto ou anónimo, a inspiração e apoio. A arte está cá para isso.

M.L: Como tem sido a reacção do público ao “With the Absolute Heart of the Poem of Life”, desde o seu lançamento até agora?
M.R: É a melhor pergunta feita até agora, porque o público sou eu. Fiz o livro para mim e para quem vier a descobri-lo. Tenho consciência que não criei algo de fácil consumo. Por isso para responder à pergunta, o melhor a dizer é que tem sido difícil. Sem apoio da editora (entre outros entraves), sem acessória de imprensa ou qualquer tipo de publicidade o que costumo fazer é perseguir pessoas. Daí o auto-desígnio de stalker. Persigo apresentadores de programas culturais, revistas, magazines, etc. O que não é sempre garantido bem como a morte, por isso tenta-se até acabar com a paciência das pessoas. Como diz a minha mãe “as árvores morrem de pé”, e estou apenas no início.

M.L: Que balanço faz do percurso que tem desenvolvido nos últimos 3 anos como fotógrafa?
M.R: Bom, sempre bom. Estou sempre a aprender cada vez que tiro uma fotografia. Que o universo me permita tempo suficiente para aprender mais.

M.L: Quais são os seus próximos projectos?
M.R: Dos que posso falar, tentar editar um livro de ilustração e trabalhar no argumento de um filme. Actualmente, estou a trabalhar num projecto de fotografia sobre sexualidade chamado Casa 8. Stay tuned.

M.L: Qual é a coisa que gostava de fazer e não tenha feito ainda nesta altura da sua vida?
M.R: Ser psicóloga ao serviço da educação pela arte, um conceito que anda a morrer aos poucos graças a poucos recursos e à falta de “inspiração” de quem a devia espalhar pelo país. Aprender a fazer plastinação, trabalhar numa casa funerária e ter uma filha. Os filmes, as ilustrações e as fotografias surgirão pelo meio.ML

Esta entrevista não foi convertida sob o novo Acordo Ortográfico.