segunda-feira, 21 de setembro de 2015

Mário Lisboa entrevista... Carlos Neves

O interesse pelo audiovisual surgiu quando frequentou um curso de operadores de vídeo no Centro de Formação da RTP e desde aí tem desenvolvido um percurso nessa área que já conta com 3 décadas de existência e muita experiência em géneros tão diferentes. Realizador e operador de câmara, trabalhou, por exemplo, na produtora Plural Entertainment Portugal (ex-NBP) entre 1994 e 2010, e profissionalmente gostava de fazer muito mais e melhor e ainda voltar a realizar. Esta entrevista foi feita no passado dia 28 de Agosto.

M.L: Quando surgiu o interesse pelo audiovisual?
C.N: Enquanto fazia o 12º ano de escolaridade na Escola d’Artes Decorativas António Arroio tive a oportunidade de frequentar em simultâneo um curso de operadores de vídeo no Centro de Formação da RTP. Aí foi “amor à primeira vista”, apaixonei-me pelo trabalho de câmara e nunca mais deixei de fazer televisão.

M.L: Quais são as suas influências nesta área?
C.N: A minha primeira influência foi o realizador Herlander Peyroteo com quem tive o privilégio de aprender, primeiro no CF e depois na produtora TV5 Megahertz onde fiz a minha primeira série televisiva “Cobardias” (RTP). Depois mais tarde na produtora Edipim, conheci o meu outro mentor, o realizador Nuno Teixeira. Estes dois senhores tão diferentes no estilo (clássico/moderno) e na atitude, ensinaram-me as bases do que era trabalhar em televisão tanto na forma como no conteúdo e desde a maneira de estar ao rigor com que lidavam com todo o processo foram sem dúvida as minhas maiores referências. Tinham em comum o gosto pela ficção.

M.L: No audiovisual, tem trabalhado em géneros tão diferentes. De todos os géneros que tem trabalhado até agora, qual é o que prefere mais?
C.N: Sem dúvida alguma, a ficção.

M.L: Ao longo das últimas 3 décadas tem desempenhado tanto as funções de operador de câmara como de realizador. Em qual destas atividades em que se sente melhor?
C.N: Assumir as funções de realizador é sem dúvida o mais gratificante, no entanto confesso que por vezes me é difícil dissociar isso da operação de câmara.

Trabalhar em equipa com atores e técnicos é fantástico, poder moldar os diferentes componentes quer artísticos quer técnicos de forma a poder narrar a história conforme a visualizámos é o gozo supremo.

M.L: Qual foi o trabalho que mais o marcou, até agora, durante o seu percurso profissional?
C.N: Provavelmente “A Jóia de África” (TVI), tanto a nível pessoal como profissional.

M.L: Foi co-realizador da telenovela “Tempo de Viver” que foi exibida na TVI entre 2006/07. De que forma este projeto foi gratificante para si a nível de reconstituição histórica (11/9/2001)?
C.N: Foi um desafio lançado pelo coordenador do projeto e o autor do guião, o grau de dificuldade na execução do que estava escrito ao nível da reconstituição histórica e do contexto da história foi de facto um aliciante extra, apesar de achar que não se coaduna com o contexto da produção de telenovela, não é justo hipotecar num primeiro episódio o orçamento de um projeto inteiro. O resultado foi impactante mas efémero do ponto de vista da narrativa… Outro exemplo disso foi a novela “Olhos nos Olhos” (TVI), tempestades com ventos ciclónicos, acidentes de automóvel, derrocada de edifício, etc… tudo no 1º episódio.

Vale a pena também fazer referência a um outro projeto que do ponto de vista da reconstituição histórica teve tanto ou mais impacto e que creio ter sido bem mais equilibrado. As cenas do primeiro episódio da telenovela “Dei-te Quase Tudo” (TVI) relativo ao 25 de Abril de 1974.

M.L: Como vê, atualmente, o audiovisual, a nível global?
C.N: Com bastante apreensão, salvo honrosas exceções, é gerido por pessoas que pouco ou nada têm conhecimento do que consta realmente em todo o processo produtivo, como tal e por ignorância, não reconhecem nem sabem identificar a importância nem a especificidade dos diferentes “papéis” que cada um deve representar nesse processo, em resultado disso vulgarizam-se as funções, desrespeitam-se os mais experientes e cometem-se erros banais de forma consistente.

No final vêm-nos dizer que não há dinheiro e que a culpa é da crise! Quando na realidade nunca como agora dispusemos de tantas ferramentas para agilizar o processo, ou de técnicos e atores que fruto do percurso que fizeram, acumularam uma experiência e conhecimento que é menosprezado apenas por ser inconveniente.

Os restantes (que gerem e tomam decisões) são condicionados pelo mercado e acabam a alinhar pelo mesmo diapasão, apesar de aqui ou ali se lhes vislumbrar o sonho de um dia fazer as coisas de forma diferente.

M.L: Entre 1994 e 2010, trabalhou na produtora Plural Entertainment Portugal (ex-NBP). Como vê o percurso que a produtora tem desenvolvido, desde a sua fundação até agora?
C.N: Foi na sua origem fundamental para o despertar de forma consistente, do que agora se chama de Ficção Nacional, reuniu os profissionais que na altura apostaram nesse sonho de fazer ficção contra a corrente que dizia que não era rentável e apostava maioritariamente no entretenimento.
  
O tempo veio mostrar que o sonho era possível, depois de termos conquistado primeiro na RTP e depois na TVI a liderança nas audiências com conteúdos produzidos pela NBP veio o natural reconhecimento e apetência pela empresa. Surgiu então o vínculo à Media Capital e perdeu-se a independência de produzir conteúdos para os diferentes canais e eventualmente a aposta (que quanto a mim seria um sonho tornado realidade) de produzir independentemente (nessa altura produzíamos séries para a RTP1 e SIC e telenovelas para a TVI e RTP1) e através da NBP Internacional os nossos conteúdos tinham já um mercado interessante. O crescimento massivo da produção de telenovelas em detrimento de outros formatos na minha opinião foi um passo atrás naquilo que tinha sido até então a evolução da empresa. Mais tarde com a saída do António Parente da gestão da empresa houve um sentimento misto de que se poderia inverter o rumo das coisas pela necessidade de renovar ou que tudo se iria desmoronar por falta de liderança e objetivos firmes. O que veio a suceder depois aliado à conjuntura económica veio condicionar a produção e até agora pouco ou nada de novo nos trouxe.

M.L: Qual conselho que daria a alguém que queira ingressar numa carreira na área do audiovisual?
C.N: Que diversifiquem a sua área de conhecimentos e contactos, o nosso mercado é mínimo e muito fechado. O protecionismo praticado por diferentes grupos numa lógica de sobrevivência não ajuda à evolução/progressão, poucos são os que conseguem singrar por mérito sem ter de passar por se sentirem inconvenientes.

M.L: Que balanço faz do percurso profissional que tem desenvolvido até agora?
C.N: Sinto-me realizado e orgulhoso com o percurso que fiz até agora, mas faço tensões de fazer muito mais e melhor…

M.L: Quais são os seus próximos projetos?
C.N: Continuar todos os dias a batalhar por novos desafios e a aventurar-me por terrenos desconhecidos… Sempre com o olho em eventuais mudanças/oportunidades na área da produção de conteúdos, em particular na ficção nacional.

M.L: Qual é a coisa que gostava de fazer e não tenha feito ainda nesta altura da sua vida?
C.N: Voltar a Realizar.ML

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