R.P.T: Eu acho que foi o Cinema
que me levou para a Comunicação Social, porque eu desde criança fiquei amigo do
“monstro”. O Cinema é um “monstro”, o Cinema em si simboliza, atrai e molda a
vida, e a dada altura o Cinema foi um espelho que eu tive para ver os outros e
ver a vida. No fundo, não era só um entretenimento. Mesmo desde criança, era
algo vital, era quase uma bolsa de oxigénio. E a partir de muito cedo, o Cinema
foi de facto uma atração fatal para mim.
M.L: Quais são as suas referências nestas duas áreas?
R.P.T: Eu acho que o
discurso de alguém que escreve sobre cinema tem que ter uma vertente pessoal e
tem que ter uma componente também de relação muito pessoal com o objeto de
arte. Nesse sentido, eu gosto de textos que me desafiem, pelo menos enquanto
leitor, a pôr-me no lugar do objeto de arte, e isso para mim é o que me dá mais
gozo quando leio críticas, e nesse sentido eu gosto muito do Peter Travers, da
falecida Pauline Kael. No Cinema, eu gosto de pensar que ninguém é sagrado, eu
não ponho ninguém intocável, mas claro que eu tenho os meus próprios ídolos
como, por exemplo, o David Lynch e o (Stanley) Kubrick.
M.L: De tudo o que tem feito até agora tanto na
Comunicação Social como no Cinema, houve algum trabalho em particular que foi
tanto divertido como pessoal de se fazer?
R.P.T: Eu gostei muito de
arrancar com o “Cinetendinha”, que foi uma ideia que o Pedro Boucherie Mendes
me propôs e que era precisamente mostrar o que é o meu dia-a-dia de uma forma
informal e verdadeira e isto é muito gozo. Em 2016, eu pude ir aos Óscares e achava
que era uma coisa inacessível e de repente estava lá ao lado das estrelas
todas, e fui também aos Independent Spirit Awards e esse tipo de coisas, para
alguém que cresceu a amar o cinema, é forte.
Rui Pedro Tendinha na altura dos Óscares 2016 |
M.L: Também tem alguma experiência na realização. Gostava
de, um dia, desenvolver uma carreira paralela como realizador?
R.P.T: Quando eu faço
cinema documental, tenho feito de uma ordem de muita encomenda. Eu não tenho
aspirações artísticas, quando faço os documentários. A minha vocação é escrever
sobre cinema.
M.L: Em 2012, escreveu o livro sobre auto-ajuda no
cinema “100 Filmes
Que Podem Mudar a Sua Vida”. 6 anos depois da publicação do livro, acha que as
pessoas ainda podem precisar de auto-ajuda no que toca ao cinema?
R.P.T: Eu podia fazer outro volume, mas agora se me
desafiarem para escrever um livro, eu gostava de escrever um livro de
entrevistas. Uma pessoa está triste, com depressão, que vá ao cinema, faz bem
ir ao cinema.
M.L: Numa era muito tecnológica, complexa e sombria e
em que o Cinema está muito mais evento, acha que o Cinema ainda pode ter
capacidade de dar alegria e emoção como no passado?
R.P.T: É verdade que o
Cinema está muito mais evento, mas há sempre lugar para tudo, há sempre um lado
de resistência, e festivais como o Festival de Cinema Luso-Brasileiro de Santa
Maria da Feira são um bom exemplo de haver ainda quem faça um cinema pessoal,
experimental, de ensaio. O Cinema pode ter sempre um grande ponto de
interrogação e de questionamento a nível artístico e nesse sentido poderá
sempre haver esse cinema mais mainstream,
mas há de haver sempre esse lado mais resistente.
M.L: Qual conselho que daria a alguém que queira
ingressar numa carreira seja na Comunicação Social ou no Cinema?
R.P.T: A Comunicação
Social está a viver momentos difíceis. O jornalismo é uma profissão que se
desvalorizou quer se queira quer não. Temos que ser todos muito mais
analíticos. O jornalismo parece que sobre isso está a ganhar ao jornalismo de
pensamento e isso é uma pena. Eu acho que o jornalista tem que ter uma opinião
e tem que ter uma coisa que, por exemplo, o Eduardo Prado Coelho tinha que era
o cálculo de não só dizer uma opinião, mas de pensamento, de fluição sobre o
mundo que vê. Hoje em dia, como temos tantos acessos às críticas e aos sites,
nós precisamos é de seletores que pensem e que não façam só o trabalho
preguiçoso. Esse é o meu conselho que eu dou.
M.L: Que balanço faz do percurso que tem desenvolvido
até agora como jornalista de cinema?
R.P.T: Abdiquei da minha
vida pessoal, passo a vida a viajar, eu já tive três divórcios e nunca consegui
ser pai, porque o Cinema absorveu-me.
M.L: Qual é a coisa que gostava de fazer e não tenha
feito ainda nesta altura da sua vida?
R.P.T: Eu gostava muito de
fazer uma ideia de residências artísticas de Cinema. É uma utopia.ML
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