M.L: Quando surgiu o interesse pelo audiovisual?
A.B.C: Muito cedo, em
criança, mas só na juventude é que decidi que queria estudar cinema, apesar de
ter entrado no Conservatório um pouco tarde (com 22 anos), pois nessa altura
fui obrigado a cumprir o serviço militar. Mas desde muito cedo comecei a
interessar-me por filmes. Onde vivia, havia dois cinemas (Academia Almadense e
Incrível Almadense). Creio que a maior parte do tempo, em criança e jovem, era
passado nessas salas de cinema ou na rua com amigos. Mas o meu espaço de
liberdade e evasão era a sala de cinema.
M.L: Quais são as suas referências nessa área?
A.B.C: Há imensas. A maior
parte das referências foram acontecendo na Escola de Cinema onde nos
apaixonamos pelos (Jean-Luc) Godard, (Jean) Renoir, (Robert) Bresson, (Michelangelo)
Antonioni, (John) Ford). Mas isto é um fenómeno que não se interrompe. Ainda
hoje continuo a ser surpreendido por filmes ou séries que me influenciam,
porque os criadores que questionam a gramática cinematográfica e que a
confrontam para lhe acrescentar algo nunca deixarão de existir. São esses os
objetos que me interessam, aqueles que usam os códigos para corrompê-los.
Também me interesso pelo cruzamento das linguagens documental e ficcional, de
que modo estão balizadas e até que ponto estamos sempre a encenar ou a falsear
uma situação para obter um resultado. Até que ponto não estaremos a partir da
mesma essência?
M.L: Tem coordenado produções televisivas na atual
Plural Entertainment Portugal desde 2008. O que é que tem aprendido ao exercer
esse tipo de função nesta última década?
A.B.C: Acima de tudo,
manter o equilíbrio entre as realidades artísticas e orçamentais, mas também,
manter a calma quando aparecem imprevistos e relativizar as coisas menos boas.
Neste meio, como em outros meios, aprende-se muito sobre a natureza humana,
principalmente no que diz respeito à gestão dos egos.
M.L: Uma das primeiras telenovelas que realizou foi “A
Senhora das Águas”, que a RTP exibiu entre 2001/02. Que recordações guarda
desse projeto em particular?
A.B.C: Creio que foi mesmo
a minha primeira novela. Antes só tinha feito séries. O que me vem à memória
desde logo é o facto de ser uma equipa muito unida. E o elenco era muito
especial. O ambiente era espetacular. Foram 6 meses a rir.
M.L: Realizou o documentário “Antes de a Vida Começar”,
sobre a atriz Isabel de Castro, e que estreou após o seu falecimento em
Novembro de 2005. 13 anos depois, houve alguma coisa que conseguiu extrair da
sua interação com a própria naquela altura?
A.B.C: A Isabel foi uma atriz
enorme que sempre quis passar despercebida. Fez vinte e tal filmes em Espanha e
não se reconhecia nos cartazes da Gran Vía em Madrid. Bastantes vezes dizia
“carreiras… só de autocarros”. É impossível esquecê-la. O documentário que fiz
com ela, sobre ela, ensinou-me, sobretudo, aquilo que é uma pessoa a não se dar
muita importância a si própria, mas, ao mesmo tempo, tentar alcançar uma
relativa liberdade.
M.L: Nestes tempos difíceis, retratar histórias
humanas é cada vez mais uma urgência no cinema?
A.B.C: Sim, talvez, mas
mais importante que a história é a abordagem que se escolhe. No cinema ou
qualquer arte o que faz sentido é usar as suas próprias ferramentas. No cinema,
as ferramentas são a Câmara e a Montagem e o objetivo de um filme deve procurar
uma reflexão sobre essas ferramentas e sobre o mundo onde vivemos. O cinema não
serve para alienar nem para comer pipocas.
M.L: Qual conselho que daria a alguém que queira
ingressar numa carreira no meio audiovisual?
A.B.C: Que tenha coragem
para isso e no momento de desistir que siga em frente. Faça em vez de se
queixar.
M.L: Que balanço faz do percurso que tem desenvolvido
até agora como realizador?
A.B.C: Não faço a mais
pequena ideia. Isso é trabalho para quem analisa, escreve e critica.
M.L: Qual é a coisa que gostava de fazer e não tenha
feito ainda nesta altura da sua vida?
A.B.C: Ler e meditar todos
os dias.ML
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