quarta-feira, 31 de julho de 2019

Mário Lisboa entrevista... Joana Brandão

Estreou-se na representação em 1997 com o espectáculo "O Triálogo ou o vortex cor-de-rosa" no Teatro da Comuna e desde então nunca mais parou. Lutadora e dedicada, também tem acumulado experiência nas diferentes formas de dirigir, tendo-se estreado na realização com o documentário "Terra" em 2018, e recentemente participou no díptico "A Verdade"/"A Mentira", que esteve em cena no Teatro Aberto durante quatro meses e está nomeado para o Globo de Ouro de Melhor Actor de Teatro (Miguel Guilherme). Esta entrevista foi feita, por via email, no passado dia 4 de Junho.

M.L: Quando surgiu o interesse pela representação?
J.B: Desde muito pequena que ia muito ao teatro, com a minha mãe. Ia ao Festival de Teatro de Almada, desde muito pequena. Sou de Almada, um concelho que nos anos 80/90 sempre apoiou muito o teatro e a música, havia muitos grupos de teatro amador. No 9º ano escolhi a opção de teatro na escola e fui aluna da Luísa Cruz. Foi a minha primeira professora de teatro! Na altura comecei logo a fazer teatro amador. Tive um grupo de teatro que se chamava B.O.T.A.-Brigada Organizada de Teatro Actual. Fazíamos imensos espectáculos. Adorávamos ensaiar, criar...

M.L: Quais são as suas referências, enquanto actriz?
J.B: A Luísa Cruz é sem dúvida uma delas. Foi muito bom para mim, a primeira vez que trabalhei com a Luísa. O mais curioso é que estava a fazer um espectáculo com ela, quando soube que estava grávida do meu primeiro filho. 9 anos mais tarde, ele estreia-se no cinema, com a Luísa a fazer de sua mãe, no filme “Pedro”, de Laís Bodanzky.

M.L: Estreou-se como actriz em 1997, com o espectáculo “O Triálogo ou o vortex cor-de-rosa”, no Teatro da Comuna. Que balanço faz destes últimos 22 anos?
J.B: São 22 anos de resistência, em que nunca deixei de trabalhar, mas a inconstância inerente a esta profissão é o mais desgastante! Principalmente quando não há políticas culturais que defendam verdadeiramente as artes.




M.L: Sendo uma mulher do pós-25 de Abril, o que é que aprendeu ao criar o seu monólogo “Coragem Hoje, Abraços Amanhã”, no que toca à condição feminina?
J.B: Aprendi muito. Foi um trabalho intenso de recolha de testemunhos de mulheres que foram presas e torturadas. Há testemunhos e histórias que eu não fazia ideia, mas aconteceram e não foi assim há tanto tempo. O mais interessante para mim, foi poder dar voz a essas mulheres. Perceber como suportaram aqueles momentos duros. Gostava muito de escrever outro monólogo sobre “o outro lado”. Sobre as “pides” que torturavam. Perceber o que as moviam, o que sentiam! Mas não é fácil! Algumas dessas mulheres ainda são vivas, mas vivem totalmente no anonimato.


Joana Brandão no monólogo "Coragem Hoje, Abraços Amanhã"
M.L: Foi premiada em 2017 com o Prémio Autores de Melhor Actriz de Teatro pela peça “Constelações”, onde deu um discurso muito emotivo. Que recordações guarda desse momento em particular?
J.B: Como achei que não ia ganhar, pensei no que gostaria de dizer, caso ganhasse, mas não me preparei muito. O espectáculo era muito bonito, muito intenso. A minha personagem tinha cancro. No dia do primeiro ensaio eu tinha ido ao funeral de um amigo. O meu discurso foi emotivo porque dediquei o prémio a esse amigo, que morreu de cancro e à minha amiga (sua mulher), que esteve sempre ao lado dele.


Pedro Laginha e Joana Brandão na peça "Constelações"
M.L: Recentemente co-protagonizou o díptico “A Verdade”/“A Mentira”, de Florian Zeller e encenado por João Lourenço, que esteve em cena no Teatro Aberto durante quatro meses. Este díptico foi uma revelação para si no que toca a explorar a natureza das relações?
J.B: Não foi uma revelação. Com 41 anos a ficção já não me surpreende. A natureza das relações humanas no dia-a-dia é bem mais complicada!


Patrícia André, Joana Brandão, Paulo Pires e Miguel Guilherme
M.L: A encenação/direcção de atores e o ensino têm sido uma constante descoberta para si principalmente como pessoa?
J.B: A encenação requer muito trabalho. Muitas escolhas, opções, procura de uma linguagem e forma de contar uma história. Sobre o que quero falar. A direcção de actores e a docência (que faço há muitos anos) prende-se mais com a capacidade de poder despertar ferramentas interiores nos outros. Uma verdadeira descoberta para mim foi a realização do meu documentário “Terra”. Percebi que é bem mais confortável estar “do outro lado” da câmara!

M.L: Qual conselho que daria a alguém que queira ingressar numa carreira na representação?
J.B: Verem muitos espectáculos (teatro e não só), lerem muitas peças de teatro e outro tipo de literatura, irem muito ao cinema, exposições, etc. e nunca se deixarem deslumbrar!




M.L: Qual é a coisa que gostava de fazer e não tenha feito ainda nesta altura da sua vida?
J.B: Escrever e realizar uma longa-metragem, mas já estou a tratar disso!ML

Esta entrevista não está sob o novo Acordo Ortográfico

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