M.L: Quando surgiu o interesse pela representação?
M.P: Quando comecei a
fazer teatro aos onze anos percebi que era a arte que me permitia desfrutar o melhor
de mim enquanto ser humano, o prazer que me dá e ao mesmo a subjetividade e o
facto de provavelmente nunca saber avaliar o que é certo ou errado, apenas o
que é espontâneo ou não. Das artes é a que mais conforto e paz de espírito me
dá, costumo dizer que é um vírus, um amor platónico, uma adição sem o qual não
sei quem sou nem quero ser.
M.L: Quais são as suas referências, enquanto atriz?
M.P: Apesar de ser uma
jovem atriz portuguesa, a Sara Barros Leitão tem para mim tudo o que uma
geração de atores deve seguir, uma dedicação, um profissionalismo, um amor à
arte e um exemplo do que de mais belo se faz pela representação e pelos seus.
Quanto a atores mais
internacionais, tenho muitas referências, cresci fascinada com a versatilidade
de muitos atores que arriscam pela ousadia e transformação total em cada papel,
e é isso que procuro para mim, não me repetir.
M.L: De todos os trabalhos que tem feito até agora
como atriz, houve algum que a tenha feito questionar o Mundo e o que está à sua
volta?
M.P: O mais recente, a
"Maggy" na série "Lavender". Sinto que me salvou
internamente, estava num timing meio
instável a nível pessoal, à espera de um resultado de uma biópsia. Chegou o
guião para eu ler, e quando eu antes tinha pensado que caso fosse grave iria
abster-me de tratamentos que me iriam torturar mais que um cancro, ao ler a
força de uma doente como sempre me imaginei, forte, e não derrotada como me
estava a sentir antes de ler o guião, decidi, que quando eu tiver de passar por
algo assim, serei a "Maggy" novamente!
Sempre quis rapar o cabelo em personagem, sinto que é um privilégio, ainda não surgiu oportunidade que me permita abraçar a personagem nesse sentido, mas aguardo por algo assim.
Todas as personagens que vou fazendo são maneiras de viver mais do que viveria se não fosse atriz, questiono sempre, não a personagem, mas o mundo à sua volta, à "nossa" volta.
M.L: Como atriz, tem-se baseado essencialmente entre
Lisboa e Londres. Do ponto de vista artístico, Portugal devia aprender mais com
a Inglaterra?
M.P: Sem dúvida, estamos
sempre atrasados, somos pequenos, temos mais potencial do que aquele a que nos
permitimos, nós fazemos mais com menos, mas a mentalidade é o que mais está
lento, dou um exemplo muito prático, um ator, a não ser por questões
contratuais jamais deveria ter de dar a idade num casting, em Inglaterra fala-se em "Playing Age", é
ridículo que ainda tenhamos que ser julgados pela data em que nascemos, e
depois somos chamados para castings
para o qual não temos o perfil físico, porque um número não nos define... Para
não falar que tudo o que se faz em termos de queimar imagem é bem mais
imediato, lá está, mentalidade. O cinema independente, ou as produções
académicas entre tantas outras são normalmente pagas lá, mesmo que
simbolicamente, e cá, nem despesas na maioria das vezes. Eu quando tirei design também tive de pagar o meu
material, acho que mais ainda deveríamos pagar de alguma forma às pessoas que
dão vida aos nossos trabalhos, à semelhança do que se faz lá fora mais do que
se faz cá dentro.
M.L: Tem trabalhado ultimamente com os The Lisbon
Players que têm passado por tempos difíceis. Como olha para o percurso que a
companhia tem desenvolvido desde 1947 até agora?
M.P: Eu já só gosto de
estar em palco em inglês, o português é uma língua, quase que sagrada, é como
trabalhar talha dourada, é difícil encontrar projetos aliciantes na nossa
língua, já o inglês em palco, está agora em extinção... E é uma vergonha,
Lisboa está cada segundo mais cosmopolita, por isso é que não sinto falta do
multiculturalismo de Londres, mas é uma miséria abater a companhia mais antiga
e completamente autossustentável que são os The Lisbon Players, capitalismo e
miséria são sinónimos nesta história, se por ventura eu deixo de poder
trabalhar em inglês por aqui, ou volto para fora ou hei de fazer com que algo
de novo surja por cá.
O elenco e a equipa de "The Misanthrope", a mais recente produção dos The Lisbon Players |
M.L: Em paralelo com o seu trabalho como atriz, também
tem desenvolvido um lado mais empreendedor ao criar vários projetos artísticos.
A Mafalda empreendedora é indissociável à Mafalda atriz?
M.P: Frequentemente tento
reconcentrar-me na exigência da profissão, no entanto, o que acontece muito é
que surgem necessidades de mercado a mim e aos meus colegas que me fazem mexer
em projetos e ideias que nos dêem melhores condições ou que simplesmente não
nos deixem estagnar.
O grupo que criei em
Londres ou iniciativas que tenho guardadas em mente, só não estão na mesa por
personagens que vão roubando a prioridade e também pela falta de meios para os
concretizar da maneira que quero, mas quando houver tempo e dinheiro, passo a
redundância, volto a mexer neles, o mercado português precisa de evoluir,
expandir, e nós atores temos responsabilidade também.
M.L: É filha da artista plástica Deolinda Almeida.
Como vê a evolução que a sua mãe tem tido até agora nesta área específica?
M.P: Eu só tenho um dom
assumido, herdei as mãos da minha mãe, que pinta como ninguém, eu vejo-a como uma
artista pura, em estado bruto, sinto que jamais se adaptará ao sistema, e essa
é uma forma de expressão que vai fazer com que o valor que o trabalho tem não
tenha todo o reconhecimento que merece, eu vejo constante evolução plástica,
mas em como todas as artes vejo falta de exposição das obras e visão que está
por descobrir pelo público em geral.
M.L: Qual conselho que daria a alguém que queira
ingressar numa carreira na representação?
M.P: Que como a Fernanda
Montenegro diz, que questione os motivos pelo qual o faz, oiço muitos jovens atores
a dizerem que começaram pela fama, e que mudaram, primeiro sinto que ao o admitirem
que demonstram maturidade, mas ao mais leve indício de desequilíbrio voltam a
demonstrar qual o chamamento base, na minha opinião, frágil. O que aconselho,
sim, aos restantes, que deixem que a cegueira canse os de espírito volátil, e
que vivam o momento, em paz com cada dádiva que é uma nova personagem, nós
pensamos demasiado, "onde é que vou chegar", importante é nunca parar
de viver o presente, as oportunidades vêm para quem não desiste e é sensato ao
saber que não vai viver disto, mas que se acontecer, melhor, mas que não conte
com o sustento da arte, nem com a fama... Não acredito em talento, nem em
sorte, acredito em profissionalismo e dedicação.
M.L: Que balanço faz do percurso que tem desenvolvido
até agora como atriz?
M.P: Olhar para trás é
muito importante, não com rancor nem com presunção, mas como quem em vez de
fazer uma lista de coisas a fazer, mas sim de pequenas conquistas que se vão
fazendo, eu fiz esse exercício em Londres, tinha acabado de ter um colega a
entrar em "Game of Thrones" porque o sugeri para um casting, trabalhar como parceira de cena
com o James Phelps, um dos gémeos do "Harry Potter", ou até mesmo ter
estendido a roupa ou ter sido paga por uma curta-metragem que acabou à hora
prevista, enfim, devemos pensar mais se estamos no caminho certo para estar bem
no momento. O dia de amanhã não interessa, eu estou pronta para personagens
novas, o que mais tenho medo é de me repetir, sinto que não o costumo fazer
apesar das limitações de oportunidades, sinto que estou em constante evolução,
é nisso em que acredito, é isso que procuro.
M.L: Qual é a coisa que gostava de fazer e não tenha
feito ainda nesta altura da sua vida?
M.P: Quero muito fazer
mais Cinema e Televisão, cada vez mais e mais. Não me deixaram entrar nos Estados Unidos por terem visto na Internet que sou
atriz mas um dia, as "fronteiras" hão de cair.
https://player.vimeo.com/video/116612364
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