O interesse pelo audiovisual surgiu desde muito cedo, e tem desenvolvido um considerável e versátil percurso nessa área, trabalhando principalmente como repórter de imagem na delegação da SIC em Coimbra. Apaixonado pela arte cinematográfica, desde 2012 que é co-anfitrião da série de podcasts, "VHS-Vilões, Heróis e Sarrabulho", que é dedicada nomeadamente ao chamado Cinema chunga, e, atualmente, está a trabalhar num projeto documental sobre o espírito estudantil de Coimbra. Esta entrevista foi feita no passado dia 7 de Fevereiro.
M.L: Quando surgiu o interesse pelo audiovisual?
P.F: O interesse surgiu
muito cedo. Durante a adolescência chegava a ver 3 ou 4 filmes por dia! Via
tantas vezes os mesmos filmes que chegava a saber as falas de todas as
personagens! Mentalmente, dissecava as sequências para perceber como tinham
sido montadas e com a ajuda do controlo remoto do leitor VHS, descobri vários
erros em filmes de grande orçamento. Tinha 18 anos quando tive o meu primeiro
contacto com uma câmara de filmar e foi um momento mágico. Soube naquele
instante que aquele objeto iria marcar profundamente a minha vida. Antes de
começar a filmar, a minha primeira paixão foi a fotografia a Preto &
Branco. Adorava a forma como as sombras realçavam as texturas e os contornos
dos objetos ou das pessoas. Fotografava tudo o que fosse um potencial cenário
para as histórias que imaginava e chegava mesmo a fazer storyboards fotográficos. A parte mais desesperante era a espera
pela revelação dos negativos, demorava cerca de uma semana até perceber se todo
o esforço tinha valido a pena. Tudo fazia mais sentido a Preto & Branco, o
Mundo parecia mais real do que se fosse a cores! Esta forma de ver a vida sem
Cor, influenciou-me de tal forma, que os meus primeiros trabalhos de ficção e
documental foram também filmados a Preto & Branco.
M.L: Quais são as suas influências nesta área?
P.F: As minhas influências
são muito variadas, vão desde o Cinema independente ao Cinema mais comercial,
desde os autores contemporâneos aos grandes mestres que quebraram barreiras na
linguagem cinematográfica.
Quanto à inspiração, essa
é retirada de nós próprios e do Mundo que nos rodeia. Todos os cenários
constantes nos meus projetos, são locais por onde passei e que de alguma forma
influenciaram a minha vida. Cada paisagem tem uma carga emocional diferente que
no filme é representada por uma tonalidade que lhe confere uma identidade
própria. Sinto que a paisagem e todas as características intrínsecas que a
definem, transparecem para o grande ecrã e influenciam a história que nos é
contada quase como se fosse uma personagem.
M.L: Ao longo do seu percurso profissional, tem
trabalhado no Cinema e na Televisão. Qual destas áreas que mais gosta de
trabalhar?
P.F: Apesar da base
audiovisual comum, são duas áreas bastante distintas e com uma linguagem
diferente, mas ambas têm o seu encanto.
Sou alguém que gosta de
contar histórias e desde o início que essa é a minha principal motivação. Tanto
as histórias reais como as ficcionadas, têm pontos de convergência na forma de
serem contadas, mas a linguagem adapta-se ao tema abordado. Não existem regras
fixas e todos os dias surgem novas formas de contar histórias, formas essas,
muitas vezes impulsionadas pela evolução tecnológica que dá liberdade ao autor
para transpor fronteiras.
Em reportagem não há guião
nem muita margem para planeamento e isso faz com que haja uma constante adaptação,
o que diminui o tempo de reação ao que está a acontecer e ajuda-nos a ser
sucintos no tratamento dos factos.
Quanto à ficção, a simples
criação de algo novo dá-me um tremendo gozo, porque tenho liberdade total para
contar a história da forma como julgo que deve ser contada, e ver o produto
final numa tela de Cinema perante uma plateia, é a melhor recompensa.
M.L: Qual foi o trabalho que mais o marcou, até agora,
durante o seu percurso profissional?
P.F: O trabalho que mais
me marcou foi sem dúvida a minha primeira curta-metragem, "Outono"
(2001), um falso documentário a Preto & Branco sobre a solidão na terceira
idade. Marcou-me em dois sentidos, primeiro porque a rodagem ajudou a criar uma
maior aproximação relativamente ao meu avô, o sujeito do tema do filme, e em
segundo lugar, porque arrecadou o Prémio da Critica Internacional no primeiro
festival em que participei, o que muito me motivou a continuar a perseguir o
meu sonho no mundo audiovisual.
M.L: Atualmente, trabalha como repórter de imagem na
delegação da SIC em Coimbra. Tendo em conta que tinha 12 anos de idade na
altura do lançamento do canal, como vê o percurso que a SIC tem feito, desde a
sua fundação até agora?
P.F: Julgo que a SIC soube
evoluir através de um processo de aprendizagem constante, acompanhando as tendências
de um público cada vez mais exigente. Surgiu motivada, com uma abordagem
refrescante, sem preconceitos e sem medos ou tabus em abordar temas
irreverentes. Era a alternativa ao que estava institucionalizado. Com a chegada
da SIC Notícias e, à semelhança dos restantes canais de televisão por cabo, a
fasquia ficou um pouco mais alta, permitindo um maior e mais fácil acesso à
informação. Vivemos numa Era em que a tecnologia e a informação se complementam
e moldam o método de trabalho dos profissionais de televisão. Hoje em dia, o
tempo passou a ser relativo, já é virtualmente possível fazer um direto de
qualquer parte do Mundo com uma câmara móvel e autónoma, usando apenas a Internet
móvel como meio de transmissão de dados. A próxima fronteira a ser ultrapassada
será a da emissão integral em HD. Julgo que existe ainda uma grande margem de
progressão na Televisão de um modo geral.
M.L: Como vê, atualmente, o audiovisual (Cinema e
Televisão) a nível global?
P.F: O Cinema, tal como qualquer
outra arte ou “negócio”, tem de ser lucrativo senão está condenado à extinção.
Um filme, por mais independente que seja, tem que conseguir pagar o investimento
feito, caso contrário, a produtora que fez o financiamento arrisca-se a fechar
portas como qualquer outra empresa. Acima de tudo, o autor terá sempre que ter
em conta que está a criar uma experiência para o espectador e não para o seu
próprio umbigo, e no processo, tentar antecipar de alguma forma as diferentes
reações que o público possa vir a ter ao ver o trabalho final.
Independentemente da zona ou local onde um projeto é desenvolvido, é
fundamental ter a consciência de que o filme terá de criar uma ligação com o
público para ter êxito nas bilheteiras. Todo o Cinema é um produto e todos os
guiões vendem algo, quer seja uma ideia, um sonho ou uma marca. A forma de
contar a história e o grau de ligação e reciprocidade que consegue atingir com
o espectador é em última análise o fator decisivo entre o sucesso ou o fracasso.
Em Portugal, um autor tem
de ser um empreendedor e por vezes abdicar do seu salário ou investir do seu
próprio bolso para criar arte. É quase necessário desenvolver um sexto sentido
que preveja a funcionalidade ou não de um projeto! Uma vez que o mercado
nacional tem pouca absorção, o passo lógico seguinte passaria pelo alargamento
do mercado de distribuição além-fronteiras, algo que outros países europeus já
fazem com enorme sucesso. O facto de Portugal pertencer à Comunidade dos Países
de Língua Portuguesa, representa uma oportunidade por explorar através de uma
língua e de uma História em comum. Não existem fórmulas mágicas, mas a
reconciliação do público português com o seu Cinema passará certamente por uma
redefinição da atribuição de financiamento com base nos resultados de
bilheteira obtidos anteriormente e por uma aposta firme na divulgação dos
filmes, porque se o público não souber que o filme existe (que está disponível
e que vai ser exibido), então as salas permanecerão vazias. A arte só existe se
for rentável, não pode sobreviver permanentemente à custa de mecenato.
M.L: Desde 2012 que é co-anfitrião da série de podcasts, “VHS-Vilões, Heróis e
Sarrabulho” (https://www.youtube.com/user/VHSPodcast/videos), que é dedicada nomeadamente ao chamado Cinema chunga. Como é que
surgiu a ideia de fazer estes podcasts?
P.F: Nos tempos de
faculdade, eu e o Daniel Louro (co-anfitrião do “VHS”), chegámos a viver na
mesma casa com outros três estudantes. Nessa altura, os videoclubes já começavam
a acusar sinais do seu declínio, mas continuavam a ser um local privilegiado
para encontrar pérolas poeirentas do Cinema de série "B". Lá em casa,
fazíamos uma espécie de tertúlia a ver estes filmes e na semana seguinte
tentávamos encontrar um título que fosse menos edificante do que o anterior.
Alguns anos volvidos, o
Daniel fez-me a seguinte pergunta, "E porque não gravarmos o que já
fazemos habitualmente quando vemos filmes?". Ao que eu respondi,
"Vamos a isso!".
M.L: Como tem sido, até agora, a adesão do público ao
“VHS-Vilões, Heróis e Sarrabulho”?
P.F: O "VHS"
pretende ser um fórum de discussão sobre todo o tipo de Cinema, desde o mais convencional
ao mais alternativo. Temos plena consciência de que o nosso público-alvo é um
nicho de movie geeks tal como nós,
mas surpreendentemente, as visualizações têm aumentado significativamente e
frequentemente temos um feedback
positivo de quem nos vê e ouve. Acima de tudo, fazemos o "VHS",
porque gostamos de Cinema e como efeito secundário, tem um efeito terapêutico surpreendente.
M.L: De todos os podcasts
feitos até agora, qual foi o mais marcante para si?
P.F: Entrevistar o Albert
Pyun foi para mim, o momento mais marcante do "VHS", porque tive a
oportunidade de falar com um dos meus ídolos de adolescência. Já vi todos os
seus filmes vezes sem conta e considero-o um mestre dentro do seu género. Foi
sem dúvida um privilégio poder entrevistá-lo em plena rodagem do seu último sci-fi pós-apocalíptico "Cyborg
Nemesis".
M.L: Qual conselho que daria a alguém que queira
ingressar numa carreira na área do audiovisual?
P.F: O desenvolvimento
tecnológico facilitou o acesso a equipamento capaz de competir com produções
mais dispendiosas e a proliferação de festivais é também sintomática desta
evolução tecnológica e reflete o panorama de produção, quer seja em género ou
em estilo, e muitas vezes acaba por ser a única plataforma de divulgação para
muitos trabalhos. Todos os anos inúmeras instituições formam jovens que tentam entrar no mercado
de trabalho. Poucos encontram trabalho na área do Cinema e Publicidade, alguns
são absorvidos no mercado da Televisão (generalista ou por cabo), mas a grande
maioria tende a criar a sua própria produtora ou tentam a sua sorte
além-fronteiras. Apesar do mercado de produção nacional não conseguir absorver
todos os profissionais que anualmente são formados, não deixem de acreditar que
algures há lugar à vossa espera. Sejam persistentes, criativos e originais, mas
acima de tudo, tenham a certeza do que querem, porque só assim conseguem dar o
extra que o trabalho exige.
M.L: Que balanço faz do percurso profissional que tem
desenvolvido até agora?
P.F: Há 16 anos que trabalho
na área audiovisual, é uma profissão desafiante e em constante evolução. Todos
os dias há algo novo para aprender. Adoro o que faço e não me imagino atrás de
uma secretária a olhar para o relógio à espera que os ponteiros decidam o que
vou fazer a seguir. Os meus dias são sempre diferentes e em cada saída para o
terreno, há um grau de imprevisibilidade que faz com que todos os sentidos estejam
sempre em estado de alerta. Sinto que cumpri os objetivos a que me propus até
agora e também sinto que ainda estou no início. Espero que o caminho a
percorrer ainda seja longo.
M.L: Quais são os seus próximos projetos?
P.F: Estou a produzir um
projeto documental sobre o espírito estudantil de Coimbra que neste momento
está em stand-by, devido a questões
de conflito de agenda, mas sobretudo por falta de financiamento para gravar os
três últimos capítulos. Estou confiante que entre 2015 e 2016 o consiga
terminar.
M.L: Qual é a coisa que gostava de fazer e não tenha
feito ainda nesta altura da sua vida?
P.F: Essa pergunta não é
fácil, porque há ainda muita coisa que quero fazer e uma vida só parece não ser
suficiente. Tenho um filho que me enche de orgulho e já plantei várias árvores,
por isso, julgo que vou guardar o livro para o fim!ML
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