M.L: Quando surgiu o interesse pela representação?
U.C: Ainda criança. Uma coisa muito
definida, embora criança. Sempre soube que seria atriz. Fui seduzida sem saber.
Um amigo de infância, na semana passada disse-me isso, que eu já falava
repetidamente com certeza em cada afirmação. Tenho a lembrança viva e a
emoção de quando pisei um palco pela primeira vez. Tinha 6/7 anos de
idade. Tudo congelou-se no mundo de fora e algo mais forte guiava-me, uma
emoção que ia furando em cada segundo do momento presente. E foi em nome deste
vibrar que percebi que esta arte completava-me e que nada se comparava. É uma
força, um prazer que nenhuma palavra nomeia. É realmente existir, ser. É maior do
que eu. É uma entrega que me envolve.
M.L: Quais são as suas influências?
U.C: São tantas...
(Baruch) Spinoza, Epicuro,
(Michel) Foucault, Rita Blanco, Fernanda Montenegro, Rachel Weisz, João
Tordo, Mário Quintana, Dani Black, Caracol, Cuca Roseta, Deolinda, Chico
Buarque, (Igor) Stravinsky, Eugenio Barba, Yoshi Oida, Betinho, (Jean) Piaget, (Sri)
Prem Baba, etc.
Gosto do que me
surpreende, do que me alimenta, do que me emociona, do que me envolve, e apesar
do Ser Humano em geral não ter dado certo, eu gosto muito de gente. Aliás para
todo o trabalho é nesta fonte que busco construir cada personagem, além de
aprender muito com o que cada uma tem de bom para passar.
M.L: Faz teatro, cinema e televisão. Qual destes
géneros que mais gosta de fazer?
U.C: Não há a questão de gostar
mais, pelo menos para mim. O mais importante é o guião, a qualidade do projeto
considerando o texto, a equipa... Nenhuma arte se faz sozinho. Por isso se
encantar com o todo é essencialmente importante. Não saio de casa, nem deixo de
fazer os meus projetos paralelos para não estar entregue e satisfeita. Eu
amo o que faço, mas há uma diferença em sentir-se esgotada a estar exausta e a
falta de prazer pontua essas duas sensações. O começar a trabalhar cedo
trouxe-me uma maturidade para escolher os projetos e não aceitar todos por ser
escolhida. Trabalhar com a imagem pode ser perigoso, caso as escolhas venham por
vaidade e não com o coração.
M.L: Qual foi o trabalho que mais a marcou, até agora,
durante o seu percurso como atriz?
U.C: “Floribella” (TV
Bandeirantes). Foi um impacto lindo e forte. Eu não sabia da dimensão e
sinceridade que era trabalhar com crianças, e depois que apresentei no Brasil,
"O Diário de Floribella" (os cadernos de “Floribella”), percebi o
quanto era importante a propriedade nas escolhas nos projetos a se trabalhar.
Mudou a minha vida. Aproximou-me mais do social... O Brasil é um País com
muitos talentos, o povo brasileiro tem uma alegria e alma indescritível, mas
que não se sustenta no dia-a-dia difícil, que é a realidade. Digo isso, porque
em “Floribella” aproximei-me do meu povo, da diversidade, da desigualdade... Quis
conhecer jovens que haviam me enviado cartas que eram de Inajá e Manari, dois
Sertões pernambucanos, região muito carente no Brasil. Lá conheci crianças de 8
anos de idade que trabalhavam 12 horas para ganhar 0,20 centavos por dia. Vocês
sabem o que é isso? Eu não sabia. Mas desde que vivi isso pensei: não posso ser
indiferente à desigualdade social no meu país. É algo mesmo que dói. Andar na
rua no Leblon, onde eu moro, e ver famílias vivendo outra realidade, sem casa,
comida e educação e pessoas passando cegas à esta realidade, e estas mesmas
deitam comida no lixo e estes moradores de rua vão lá sedentos para comerem
estes restos... Desculpa, mas não dá para invadir a casa dos espectadores com o
meu trabalho e achar que é só ir a eventos, filmar e ir para casa. Devemos
todos abraçar uma causa, agregar a correntes que venham fortalecer e lutar por
um Mundo melhor sim. E quem me trouxe este olhar foi “Floribella”, por isso
tenho muita gratidão por este trabalho com crianças... Foi nessa época que
escolhi apropriar-me com seriedade o trabalho que tenho há 11 anos com crianças
com cancro (AMICCA) e na Estrela Sports (ONG).
M.L: Como vê, atualmente, o teatro e o audiovisual
(Cinema e Televisão) no Brasil?
U.C: Tudo sempre pode
melhorar, mas têm um conjunto de novos autores sensacionais.
No Teatro, a Renata
Mizrahi envolve-me de uma forma inexplicável.
No Cinema brasileiro, o Breno
Silveira, René Sampaio, Fernando Meirelles, Walter Salles têm muita
sensibilidade.
M.L: Recentemente, participou na telenovela portuguesa
“Sol de Inverno” que foi exibida na SIC, na qual foi o primeiro projeto
televisivo que fez em Portugal. Como vê, hoje em dia, Portugal e Brasil no que
diz respeito à ficção televisiva?
U.C: Acho extremamente positivo.
E apoio cada vez mais. O Brasil já recebe muito bem os profissionais portugueses
de todas as áreas. Adorei a experiência e quero repetir.
M.L: Em 2012, o remake
da telenovela “O Astro” (TV Globo), na qual participou, ganhou o Emmy
Internacional na categoria de Telenovela. Como é que se sentiu ao saber que “O
Astro” ganhou o prémio?
U.C: Com muito orgulho, porque
realmente foi um trabalho com uma equipa maravilhosa, além de ser mais um
desafio. Eu ia fazer outra personagem, a Dora, uma cantora. Já em laboratório,
pesquisa, sem ter iniciado a gravação, a personagem não entraria mais na trama
e fui contemplada em fazer a Elizabeth. Um desafio, pois a trama se giraria
comigo e o Daniel Dantas, para descobrirmos o mistério de quem matou o Salomão
Hayalla (Daniel Filho). Uma responsabilidade urgente, pois já começaria a
gravar na mesma semana, sendo que era uma personagem sem emoção, fria,
calculista… ao contrário da Dora, artista, com a sensibilidade aflorada.
M.L: Qual conselho que daria a alguém que queira
ingressar numa carreira na representação?
U.C: Primeiro entender o porque
que quer ser atriz. Quer mesmo ser atriz ou ser famosa? Porque são coisas
completamente diferentes... Digo que são profissões distintas. Para ser
famosa, você vai para um reality-show
ou entra na vida de escândalos cor-de-rosa. Ser atriz é maravilhoso, é você ter
a oportunidade de ter várias vidas em uma, de aprender com cada personagem...
Por isso para poder oferecer material emocional e físico para uma personagem
completamente diferente de você, tem de haver entrega e conhecimento. Portanto
estude, leia, assista filmes, observe pessoas diversas: como olha, como
senta, como come, para poder ter material para construir. Um bom livro para se
começar é: "Um Ator Errante", do génio Yoshi Oida.
M.L: Que balanço faz do percurso que tem feito, até
agora, como atriz?
U.C: Sou feliz com as minhas
escolhas. Eu tenho sorte de ter construído pelo meu trabalho uma independência
financeira que me faz poder escolher e não ser escolhida, pois as nossas necessidades
diárias e mensais de um Mundo capitalista nem sempre nos oferece esta
oportunidade; e trabalhar com arte e poder traçar um perfil é uma sorte que
agradeço por ter sido orientada com maturidade a construir esta independência
financeira, sinto-me abençoada.
Artisticamente falando
tenho ainda muitos desafios para viver. O meu primeiro trabalho na TV foi com 8
anos de idade, eu era muito nova. Comecei cantando (https://www.youtube.com/watch?v=722KjjgBiXI)
e a música levou-me para a interpretação no trabalho "A Nave Mágica",
o último trabalho na (TV) Globo do Mestre Augusto César Vannucci. Depois segui
fazendo séries, novelas... parei, porque a minha mãe ficou doente e a família
sempre foi a minha base e prioridade dentro de uma escolha.
M.L: Quais são os seus próximos projetos?
U.C: Eu apresento a série
"Olha o Rio de Janeiro para você", dirigida pela maravilhosa Lúcia
Abreu, realizadora que quem me apresentou foi a querida amiga Regina Duarte em
Lisboa, na (TV) Globo Internacional. Uma série que conta a história do Rio de Janeiro
de uma forma única, celebrando os 450 anos completados neste ano. Um projeto
que tenho muita gratidão de estar. Eu estou tendo a oportunidade de aprender
muito e trabalhar com profissionais incríveis que sempre almejei.
M.L: Qual é a coisa que gostava de fazer e não tenha
feito ainda nesta altura da sua vida?
U.C:
Dedicar-me mais ao empreendedorismo social. Há 11 anos que trabalho com
crianças carentes e portadoras de cancro e aprendo muito em cada dia a ver a
vida de uma forma diferente. Coragem infinita, atitude e o sonho de querer ver
o sorriso no rosto das pessoas.ML
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