quarta-feira, 14 de dezembro de 2016

Mário Lisboa entrevista... Marcello Urgeghe

Já demonstrava ter ainda em criança uma mente muito criativa, daí o interesse pela representação, e com o passar dos anos tornou-se num ator muito respeitado, cujo percurso igualmente respeitado passa nomeadamente pelo teatro e pelo cinema. Considera-se um privilegiado no que toca a fazer tudo o que gosta e atualmente participa na ambiciosa trilogia teatral "Os Últimos Dias da Humanidade" que vai passar logo em Janeiro pelo Teatro Nacional D. Maria II em Lisboa, após ter sido estreado em Outubro passado no Teatro Nacional São João no Porto. Esta entrevista foi feita no passado dia 6 de Novembro no Teatro Nacional São João.

M.L: Quando surgiu o interesse pela representação?
M.U: Logo em criança e a primeira coisa que eu adorava era ver os amigos de família, as pessoas que iam lá à casa, eu adorava títulos, fazia muitas imitações… Aliás, um dos “pratos” favoritos da família era fazer imitações dos amigos, da minha mãe, do meu pai, e as pessoas adoravam. Foi aí que eu comecei a interessar.

M.L: Quais são as suas referências, enquanto ator?
M.U: Basicamente, tudo vem da literatura. Li muito em criança e foi aí que eu comecei a ver nascer personagens, mas grandes referências como ator são, por exemplo, o realizador John Cassavetes e os atores que trabalharam com ele (Gena Rowlands, Ben Gazzara, Seymour Cassel). Especialmente, algum cinema americano fez parte da minha formação.

M.L: De tudo o que tem feito até agora como ator, qual foi o trabalho em particular que foi muito pessoal de se fazer?
M.U: Todo o trabalho que fiz com o José Álvaro Morais, já falecido, um realizador de cinema que fez não muitos filmes (“O Bobo” (1987), “Zéfiro” (1993), “Peixe-Lua” (2000), “Quaresma” (2003). Foi talvez o realizador com quem tive mais familiaridade e onde vivi mais e como ator.

José Álvaro Morais (2 de Setembro de 1943-30 de Janeiro de 2004)
M.L: Durante estas últimas décadas, tem trabalhado principalmente em teatro e cinema, e alguma televisão também. No caso da televisão, gostava de, um dia, experimentar o género telenovela, caso haja essa possibilidade?
M.U: Não, tanto que eu recuso continuamente. É um género que eu não quero experimentar, já sei o resultado, basta ver, acho que não tem interesse nenhum para um ator. Houve agora um surto de séries na televisão e fiz pequenas participações em algumas (“Terapia” (RTP), “Os Boys” (RTP). Isso já me interessa mais, já são coisas que acho que um ator pode fazer, mas sinceramente sou sempre puxado mais ao teatro e ao cinema. É o meu território.

M.L: No caso do cinema, tem participado numa mão-cheia de longas-metragens que têm tido mais projeção internacional (“Mistérios de Lisboa” (2010), “Sangue do Meu Sangue” (2011), “Linhas de Wellington” (2012), etc.). A seu ver, estas projeções internacionais podem impulsionar mais o cinema feito aqui em Portugal?
M.U: Sim, absolutamente. Sempre que se internacionaliza um país, ele é depois conhecido e falado, e de facto as pessoas não têm noção, mas o nosso país tem muito bons atores, muito bom cinema como já não há em muitos sítios. Nós aqui temos de facto uma tradição de bom trabalho em cinema e em teatro. Somos de facto bons nisso, é verdade.

Marcello Urgeghe com o elenco e o produtor (Paulo Branco) de "Linhas de Wellington" no 69º Festival de Veneza em 2012
M.L: Gostava de, um dia, ponderar a hipótese de estrear-se na realização ou na encenação?
M.U: Sim, gostava, é um facto. Apesar disso, o mais que posso, porque eu gosto muito é de representar, mas acho que chegou a altura de abrir esse capítulo e estou agora a começar a trabalhar nisso. Tenho dois projetos que quero levar à frente, um deles é o “Ricardo III” de William Shakespeare e o outro é uma coisa escrita por mim, são coisas pessoais.

M.L: Atualmente participa na trilogia teatral “Os Últimos Dias da Humanidade” que vai passar pelo Teatro Nacional D. Maria II em Janeiro de 2017 e que para mim é a produção teatral mais antecipada de 2016. Já alguma vez imaginou que uma produção desta dimensão pudesse ser levada à cena não só em Portugal como no Mundo em geral?
M.U: Não imaginava de facto. Mas a verdade é que este é um texto incrível e mais atual não pode ser. É um texto que fala da Primeira Guerra Mundial, mas nós vemos tudo igual ao que se passa hoje. Hoje estamos nos primórdios de uma Terceira Guerra Mundial, está a começar hoje nos mesmos sítios. Não imaginava, mas de facto este pode escalar a um outro nível sim.

Marcello Urgeghe em "Os Últimos Dias da Humanidade"
M.L: Qual conselho que daria a alguém que queira ingressar numa carreira na representação?
M.U: O conselho que dou é antes de fazer pensar e depois quando for para fazer não pensar.

M.L: Que balanço faz do percurso que tem desenvolvido até agora como ator?
M.U: É o meu percurso, é a minha vida.

M.L: Qual é a coisa que gostava de fazer e não tenha feito ainda nesta altura da sua vida?
M.U: Não tenho uma coisa que gostasse de fazer. Tenho feito tudo o que gosto. Sou um privilegiado nesse aspeto.ML

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