M.L: Quando surgiu o interesse pela representação?
L.R: Desde muito nova que me interessei pela
representação. Apesar de ter sido uma aluna muito cumpridora e bem-educada, lembro-me
de estar irreverentemente em cima de uma carteira a personificar, à maneira de “Charlot”,
o (Adolf) Hitler. Lia os meus textos em voz alta para a turma, organizava
danças e teatros para as festas do liceu. Acho que sempre quis ser bailarina e
atriz.
M.L: Quais são as suas influências, enquanto atriz?
L.R: Eu sofro as minhas influências à maneira de (August)
Strindberg: um pandemónio de referências das mais diversas origens e feitios. Cada
encontro com outro artista, cada livro, cada peça, cada pensamento, cada acaso
me desviam despudoradamente do meu caminho, do meu caráter.
M.L: Faz, essencialmente, teatro. Gostava de trabalhar
mais no audiovisual (Cinema e Televisão)?
L.R: Há um tempo no teatro que me é
fundamental, um relógio biológico a que me habituei, mas a vertigem da rapidez
do audiovisual é muito atrativa. São maneiras de representar diferentes a
partir da mesma matriz. Não me preocupa tanto onde trabalho mas como e com quem
trabalho. Não gostaria nunca de estar sempre a fazer a mesma coisa, isso é a
única certeza que tenho.
M.L: Qual foi o trabalho que mais a marcou, até agora,
durante o seu percurso como atriz?
L.R: Eu costumo dizer que é o próximo e estou mesmo a
dizer a verdade. Quanto maior ou mais complexo é o papel, mais peças tem o puzzle e mais possibilidades de jogo,
mas às vezes há momentos especiais na vida de uma pessoa que tornam a
quantidade de linhas de uma personagem um barômetro irrelevante. Devo dizer que
gostei sempre de interpretar as minhas personagens, mesmo quando o trabalho
corria mal, todas me marcaram porque todas contribuíram com as suas
caraterísticas para a minha vida. Houve uma que me ensinou a rir alto, outra
que me ensinou a sofrer com dignidade, outra a fugir de mim própria, outra a
desejar homens e outra a matá-los. Algumas surpreenderam-me pela clareza com
que falaram de mim e outras ensinaram-me a esconder coisas. E muitas tiveram
colegas maravilhosos que me ensinaram que todas devam estar sempre muito bem
acompanhadas.
M.L: Em 2010, participou na peça “A Gaivota” de Anton
Tchékhov, com encenação de Nuno Cardoso e esteve em cena no Teatro Nacional São
João no Porto. Que recordações guarda desse trabalho?
L.R: Guardo más recordações e boas recordações. As más
não são para aqui chamadas, obviamente, e as boas são as que guardo de todos os
espetáculos: a minha tentativa de encontrar de uma forma o mais surpreendente
possível uma possibilidade ficcional de existência em cena, a construção de um puzzle criativo de ações a partir de
palavras no papel, o nascimento de um “Frankenstein” a partir de pedaços de texto
dos autores, do encenador, dos atores, de todos os seres com que me cruzei, enquanto
a peça se construía. Guardo ainda muito boas recordações dos aquecimentos físicos
e da vista para o rio.
M.L: Como vê, atualmente, o teatro e a ficção
nacional?
L.R: A tentar desesperadamente
existir com dignidade artística num clima de asfixia política e monetária.
M.L: Gostava de ter feito uma carreira internacional?
L.R: Apesar de ter trabalhado com artistas de outras
nacionalidades e noutros países, gostava de o ter feito muito mais, embora isso
continue sempre presente nas minhas expectativas de colaboração.
M.L: Este ano celebra 22 anos de carreira, desde que
se estreou como atriz profissional em 1992. Que balanço faz destes 22 anos?
L.R: Tempo só o do teatro e balanço só o da dança. Foram
22 anos a acertar escolhas boas ou más e a tentar ser o mais feliz que me foi
possível. E acho que consegui de um modo geral.
M.L: Além da representação, também é encenadora e
professora. Em qual destas funções em que se sente melhor?
L.R: Gosto também muito de encenar
e de ensinar. Como atriz sinto-me sempre mais frágil do que como encenadora,
tenho muito mais dúvidas. Como professora sinto que faço um trabalho imediato
mais importante. É uma trilogia que se completa: odiaria ter de optar só por
uma função.
M.L: Qual o conselho que daria a alguém que queira
ingressar numa carreira na representação?
L.R: Que seja sério no seu trabalho, que nunca se fique
pelas primeiras impressões, que leia e procure novas formas de fazer, que
treine o corpo, a voz e a alma e que procure o seu prazer e o prazer dos outros,
um prazer culto, inteligente e fruidor.
M.L: Quais são os seus próximos projetos?
L.R: Neste momento, interessam-me novas dramaturgias que
pensem o Mundo e que pretendo encenar. Tenho um projeto para mais tarde com o
João Reis, como atriz e pelo qual tenho imenso entusiasmo. Vou ainda repor em
Lisboa, “As Ondas”, a partir de Virginia Woolf, encenado pela Sara Carinhas com
As Causas Comuns da Cristina Carvalhal.
M.L: Qual é a coisa que gostava de fazer e não tenha
feito ainda nesta altura da sua vida?
L.R: Tantas coisas hoje e mais amanhã
e mais depois de amanhã. É esse desejo que me faz avançar, no teatro: querer
fazer o que ainda não fiz e continuar a descobrir e a imaginar coisas que ainda
não fiz e que quero mesmo muito fazer.ML
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